“Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o
colocaram” (Jo
20,2)
Em Jesus ocorre algo totalmente novo. Ele traz
uma nova maneira de viver que não cabe em nossos esquemas, que não se encaixa
em nossos hábitos, sempre limitados e estreitos.
O
“mistério pascal” é o salto para a novidade, para a beleza, para a
transcendência. Imersos na história e na natureza, a Ressurreição nos faz
descobrir a verdadeira extensão da Vida.
Não encontramos o Ressuscitado no sepulcro, mas
na vida. Não encontramos o Ressuscitado enfaixado e paralisado pela morte, mas
livre como a brisa da vida.
A pedra que fora removida do túmulo de Jesus
indicou a Maria Madalena uma novidade que seu coração buscava, uma novidade que
espanta, enche o coração do desejo de procura: “Ele vive”.
O
caminho dela em direção ao túmulo é símbolo da coragem de atravessar o escuro
da madrugada para ver resplandecer uma nova aurora em sua vida, pela força
criadora da única Presença que tudo sustenta, tudo recria e enche de amor. A
presença do Cristo Ressuscitado.
Na madrugada da Páscoa, Maria Madalena vai ao
sepulcro; ela é símbolo daquela comunidade que se movia entre a luz e a
obscuridade. Ainda vive focada no sepulcro (morte); por isso, “ainda
estava escuro”. Mas, ao mesmo tempo, começava a clarear
(“ao
amanhecer”) e a “pedra
estava removida” (a pedra da dúvida, da tristeza e da resignação
fatalista). Tudo parece anunciar algo definitivamente novo: é “o
primeiro dia da semana”; trata-se, nada menos, que de uma nova
Criação.
Segundo
os evangelistas, as mulheres são as primeiras testemunhas da ressurreição de
Jesus Cristo, pois Ele aparece primeiramente a elas. Segundo Tomás de Aquino o
motivo desta precedência é porque elas estavam melhor preparadas que os homens
para entender e acolher a maravilha da Vida.
E
estavam melhor preparadas porque O tinham amado mais.
Na ressurreição, a vida emerge de forma
misteriosa; ela se impõe, simplesmente. Tal realidade desperta fascinação,
provoca admiração e veneração..., porque a vida é sempre sagrada. Diante
dela ficamos extasiados, boquiabertos, escancarados os olhos e afiados os
ouvidos. Ela nos atrai por sua força interna.
Portador
de uma vida inesgotável, revelada na madrugada pascal, o ser humano vive
para mergulhar em algo diferente, novo e melhor. A vida, desde o mais
íntimo da pessoa humana, deseja ser despertada e iluminada em plenitude. Amar é romper a casca para que a
vida se expanda na doação. A morte do falso “eu” é a condição para
que a vida se liberte.
Vida plena prometida por Jesus: “Eu
vim para que tenham vida e vida em abundância”
(Jo 10,10).
“Viver como
ressuscitado” implica esvaziar-se do “ego”, para deixar
transparecer o que há de divino.
Quem se experimenta a si mesmo como “Vida”
é já uma pessoa “ressuscitada” e isso faz a grande diferença,
pois tem um impacto no seu modo de ser e de viver.
Marcadas pela ressurreição, as pessoas
captam muitos detalhes que antes não haviam percebido, vivem intensamente, amam
com mais paixão, prestam atenção a muitas coisas que antes lhes passavam despercebidas.
Tem um comportamento diferente para com os outros; há, nestas pessoas, mais
ternura, são mais sensíveis à dor e à injustiça. Ao saborear o presente da
vida, vivem como se fossem ressuscitadas.
Creem que, amando mais a vida, se afastarão mais da morte e resistirão
às hostilidades do mundo presente.
E, no entanto, continuam vivendo na mesma casa,
no mesmo trabalho, fazendo as mesmas coisas... Mas seu olhar audacioso
desperta as consciências, sacode as velhas estruturas, derruba os muros da
exclusão.
A Ressurreição não só “dá o que
pensar”, mas sobretudo, “dá o que fazer”.
O
encontro com o Ressuscitado é fonte de vida
e vida em crescente amplitude.
Quando nos dispomos a caminhar com Ele, sob a ação do Espírito, realiza-se em
nós um processo de abertura e de superação, de crescimento e de reconstrução de
nós mesmos...; tomamos consciência de uma dimensão profunda de nosso interior,
que nos permite experimentar uma outra vida,
que supera tudo o que vivemos até então.
A “vida eterna”, então, não é um
prolongamento ao infinito de nossa vida biológica. É a dimensão inesgotável e
decisiva de nossa existência. Ela torna-se “eterna” desde já.
A experiência da Ressurreição nos revela que a “vida”
é uma totalidade, ou seja, a vida presente, a vida atual, é uma vida que tem
tal plenitude que, com toda razão, podemos chamá-la de “vida eterna”, uma vida
com tal força e tão sem limites, que nem a morte mesma terá poder sobre ela.
Precisamos adquirir uma consciência mais
profunda da vida do espírito, perceber as pulsações desta vida eterna que está
em nós, do mesmo modo que, prestando atenção, percebemos as batidas de nosso
coração.
A experiência
do Ressuscitado nos faz ter um “caso de amor com a vida”.
Pois a vida
autêntica é a vida movida, iluminada, impulsionada pelo amor.
Nem sempre sabemos viver: conformamo-nos com uma
vida estreita, estéril, fechada ao novo, carregada de “murmurações”. Quando
acolhemos a presença do Ressuscitado, nossa vida se destrava e torna-se
potencial de inovação criadora, expressão permanente de liberdade, consciência,
amor, arte, alegria, compaixão... É vida em movimento, gesto de ir além de nós
mesmos; vida fecunda, potencial humano. Vida com fome e sede de significado,
que busca o sentido... Vida que é encontro, interação, comunhão, solidariedade.
Vida que é seduzida pelo amor, pela ternura. Vida que desperta o olhar para o
vasto mundo. Vida que é voz, é canto, é dança, é festa, é convocação...
Com sua presença compassiva, o Ressuscitado
desperta nossa vida, arrancando-a de seus limites estreitos e constituindo-a
como vida expansiva em direção a
novos horizontes.
O Ressuscitado nos precede, nos sustenta e, na
liberdade de seu amor, nos impele a ampliar nossa vida a serviço. Toda
peregrinação, em clima de admiração e assombro, se revela rica em descobertas e
surpresas, e desperta o coração para dimensões maiores que a rotina de cada
dia.
Nesse sentido, a vida tem a dimensão do milagre e até na morte anuncia o início de
algo novo; ela carrega no seu interior o destino da ressurreição.
Essa
nova Vida é capacidade de amar como Jesus amou; é “passar
pela vida fazendo o bem”. Somos seres ressuscitados se vivemos os mesmos critérios e valores de
Jesus, engajados em seu mesmo projeto.
A “vivência pascal” leva a querer algo
mais. É “antecipação criadora”; ela tem “rosto novo”.
É o futuro que ainda pode ser convertido em
“história nova”; é vida vivida com encantamento.
A “pedra
pesada” da nossa impotência diante da dor, do fracasso e da morte, foi
tirada pelo Mestre, que, nos chama pelo “nome” e nos desafia a viver como
ressuscitados.
Nossa
vida é uma experiência a acolher, uma aventura a amar e um mistério a
celebrar. Rompido o túmulo, removida a pedra, resta caminhar...
Deixemo-nos
iluminar, levemos a Luz da Ressurreição nas nossas pobres e frágeis
mãos, iluminando os recantos do nosso cotidiano.
Pois vida é um contínuo despedir-se e
partir; é inútil permanecer junto ao túmulo. Porque o ausente “aqui”
está presente na “Galileia”. E a Galileia é o lugar do
compromisso com a vida, a justiça e a paz.
Texto
bíblico: Jo 20,1-9
Na oração:
Para viver a partir do ser mais profundo, é preciso dedicar uma
atenção especial ao próprio coração e aprender a regozijar-se da maravilhosa vida
de Deus em cada um. Basta um repouso e o estar presente para fazer acalmar a
agitação interior e aproximar-se da fonte da vida.
- É tempo de esvaziar sepulcros; é tempo
de remover as pedras da entrada do coração que impedem a entrada da luz, da
vida, do canto...? O que lhe impede afastá-las?
- Faça memória das experiências de
ressurreição: nos encontros, na missão, sentimentos oceânicos de consolação,
clareza diante do sentido da vida, amar e sentir-se amado(a), a vivência da
bondade e do bem...
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