Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj (Centro de Espiritualidade Inaciana), como sugestão para rezar e meditar os acontecimentos da Semana Santa: SEXTA-FEIRA SANTA.
+ A
oração de hoje é profundamente silenciosa: trata-se de acompanhar Jesus no seu
caminho em direção ao Gólgota e sua morte na Cruz.
+
Silenciar o corpo, a mente, o coração... através dos “preâmbulos”: oração
preparatória, composição vendo o lugar, petição da graça...
+ Antes de “fazer o caminho” com Jesus até à Cruz, leia as indicações abaixo, como motivação para a experiência:
-
O “Deus Crucificado” é, junto à Ressurreição, a realidade mais radical
de nossa fé. Ela nos fala da fragilidade humana, assumida pelo mesmo Deus;
fala-nos da paz como único caminho, frente às outras sendas construídas sobre o
ódio, a violência ou a lei implacável; fala-nos do amor como a maior
transgressão num mundo onde muitas pessoas são etiquetadas como indignas de
serem amadas; fala-nos da dor de Deus, um Deus que não é distante, alheio ou
indiferente à criação que saiu de seu coração; um Deus próximo até o ponto de
esvaziar-se em nós, conosco, por nós; fala-nos de compromisso, de uma aliança
inquebrantável e de risco; fala-nos de vítimas inocentes e de verdugos inconscientes
que não sabem o que fazem; fala-nos da fidelidade de Deus no seu diálogo com a
humanidade, mesmo diante da rejeição do ser humano a entrar em sintonia com
esse diálogo amoroso....
Portanto, a Cruz se revela como a expressão mais radical do diálogo
amoroso de Deus: um diálogo sem palavras, mas ela é a mais eloquente,
pois fala de entrega, de solidariedade, de fidelidade total...
-
Falar do silêncio de Deus e de “como a Divindade se esconde” (EE.
196) é adentrar-nos no Mistério que está presente em toda existência: ausência,
dor, fracasso, morte... Sem Cruz não há passagem para a Vida, não
há Ressurreição.
Na
Paixão e morte de Jesus, o Silêncio de Deus não é um silêncio vazio. É
um silêncio eloquente, que nos fala: revela, desvela sem dizer, mostrando uma
vida que não necessita palavras, a vida de Jesus que é puro amor até o fim e
que, por sua vez, desvela o puro Amor de Deus.
A Cruz, por um lado, é símbolo da indiferença que mata toda possibilidade de diálogo, gerando sofrimento, exclusão e violência. Por outro lado, a Cruz de Jesus Cristo é sinal fecundo de que o ser humano não se rende à indiferença, que é capaz de se compadecer, amar e entregar a própria vida pelos outros.
- Jesus foi Aquele que não ficou
indiferente diante da fome, da doença, da violência e da morte... Seu modo de ser, suas opções, sua
liberdade diante da lei, da religião, do templo, seus encontros escandalosos
com os pobres e excluídos..., desestabilizou tudo, pôs em crise as instituições
e as pessoas encarregadas da religião. Jesus foi condenado como herege e subversivo, por
elevar a voz contra os abusos do templo e do palácio, por colocar-se do lado
dos perdedores, por ser amigo dos últimos, de todos os caídos. Tornou-se um
perigo a ser eliminado.
A
primeira coisa que descobrimos ao contemplar o Crucificado do Gólgota, torturado injustamente até à morte pelo
poder político-religioso, é a força destruidora do mal, a crueldade do ódio e o
fanatismo da mentira. Precisamente aí, nessa vítima inocente, nós seguidores de
Jesus, vemos o Deus identificado com todas as vítimas de todos os tempos. Está
na Cruz do Calvário e está em todas as cruzes onde sofrem e morrem os mais
inocentes.
-“Jesus morreu de vida”: de bondade e de esperança lúcida, de solidariedade alegre, de compaixão
ousada, de liberdade arriscada, de proximidade curadora...
Nesse sentido, a cruz de Jesus
não é um “peso morto”; ela tem sentido porque é consequência de uma opção
radical em favor do Reino. A Cruz não significa passividade e resignação;
ela nasce de sua vida plena e transbordante; ela resume, concentra,
radicaliza, condensa o significado de uma vida vivida por Jesus na
fidelidade ao Pai que quer que todos vivam intensamente.
-
Nos evangelhos, a Paixão de Jesus
não é uma simples sequência de fatos, mas
um confronto entre pessoas. Os diversos personagens
entram em contato direto com Jesus, reagindo cada um a seu modo, vivendo cada
qual o mistério do próprio chamado e
da própria tomada de posição frente a proposta
de Jesus.
Contemplar toda a galeria de pessoas que se encontra com Jesus. Cada qual com uma resposta diferente, diante de Jesus sempre igual em sua atitude de disponibilidade e de entrega.
-
Os evangelistas dão um destaque especial à presença das mulheres no caminho da Cruz, solidárias com Aquele que era vítima
da indiferença cruel.
Estão ali, precedendo-nos no caminho, e não dizem nada. É seu corpo, são seus gestos, suas mãos, seus olhos, seu silêncio... que falam por elas. A linguagem delas é a linguagem do encontro solidário. Se elas podem permanecer nessas circunstâncias, é porque amaram muito. Elas nos falam de resistência e de fidelidade, de uma presença comovedora. Estão juntas, expostas a outros olhares, como comunidade de discípulas em torno a seu Mestre, que lhes ensina, agora sem palavras, uma sabedoria muito maior.
- Em meio à impotência, elas não se
afastam da dor experimentada ao ver sofrer a quem mais se ama, senão que se
expõem ao olhar d’Aquele cujo rosto foi desfigurado.
Sobem com Ele ao lugar do abandono e da
ingratidão, levantando uma ponte de proximidade e de solidariedade que cruza a
totalidade da vida de Jesus.
Elas acompanharam a vida de Jesus muito
de perto, “à sombra”, e agora, a morte d’Ele lança uma
forte luz sobre elas, tornando-as visíveis para que todos saibam quem são elas.
Elas têm a coragem de permanecer ali,
acolhendo o acontecimento em toda sua crueldade e profundidade; elas estão de
pé, enquanto outros desistiram ou se afastaram assustados.
Daqui para a frente elas se tornarão pedagogas de um encontro que gera humanidade; elas estenderão suas mãos sobre os necessitados, com o mesmo desejo com que Jesus as estendeu, para tocar voluntariamente as pessoas enfermas, selando uma aliança, um “pacto de ternura”, com todos os desprezados e excluídos.
- Através
da contemplação, entre no caminho com Jesus, até o Calvário (cap 19 de João). Olhe as pessoas,
escute o que elas dizem; observe as diferentes reações das pessoas: os
soldados, as mulheres, Pilatos, a multidão... Basta estar presente,
silenciosamente, deixando-se afetar pelas cenas e pelas atitudes das pessoas
diante de Jesus, com a Cruz às costas.
- Faça
seu colóquio a Jesus, o homem da fidelidade ao Projeto do Reino em favor da
vida. Ele doa vida para que todos tenham mais vida.
-
Finalize sua oração, rezando “Alma de Cristo”.
-
Registre no caderno os apelos, moções... que brotaram da oração
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