Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj (Centro de Espiritualidade Inaciana), como sugestão para rezar e meditar os acontecimentos da Semana Santa: Terça-feira Santa.
+ Busque
criar um ambiente propício para a oração deste dia: espaço externo, atitude
interna, silêncio... para viver mais intensamente os “momentos finais” da vida
de Jesus.
+ Faça a
oração preparatória (de entrega), a composição vendo o lugar (a última Ceia), e
peça a Deus a graça de participar
dos sentimentos de Jesus, às vésperas de sua morte.
+ Leia as “indicações” abaixo como ajuda para “entrar em contemplação”:
- Estamos na terça-feira da Semana Santa, às
vésperas da execução de Jesus. Como ontem, somos convidados a participar de
outra ceia de despedida. A ceia de Betânia foi rica em símbolos de
amor, de amizade, de festa..., um esbanjamento de humanidade. A ceia de hoje
(em Jerusalém) é marcada por uma comoção profunda, onde Jesus se vê traído,
vendido, enganado e abandonado por aqueles que juravam fidelidade e amizade
profunda. Esta noite, Jesus começou a sentir que estava sozinho. É o sentimento
mais duro e doído que alguém pode passar.
Jesus está celebrando a última ceia com os seus
discípulos; tinha acabado de lavar os pés deles e de ter falado do dever que
temos de lavar os pés uns dos outros. Judas já tomou a trágica decisão, e
depois de tomar o último pedaço de pão das mãos de Jesus, saiu para cumprir sua
traição.
- Na contemplação da Última Ceia, um personagem vem
sempre à nossa lembrança: Judas Iscariotes. Reagimos negativamente
frente sua traição a Jesus, mas no fundo ele nos causa repulsa
porque é projeção das nossas infidelidades e traições. Ele é o espelho no qual
nos vemos.
Mas... o que vem a ser a traição? Como ela
se manifesta na nossa vida? Por que traímos a confiança do outro?
O ato de trair implica romper uma aliança que uma
pessoa fez com outra. Trair é uma ação que implica consequências, e,
quando se fala de relacionamento humano, envolve sofrimento e sensação de
abandono, gerando um estado de desconfiança generalizada naquele que foi
traído.
Traição dói na
proporção inversa da distância. Quanto mais próxima se sente a pessoa traidora,
tanto maior a dor do traído. A traição se situa no mundo das amizades,
das vinculações afetivas intensas, das ligações íntimas, das proximidades de
vida.
- Judas se tornou o símbolo da traição porque fazia
parte do grupo íntimo dos apóstolos. Foram anos de convivência nas mesmas
caminhadas, nas noites ao relento, nas pregações, nas refeições simples do
dia-a-dia e nas festas. Jesus e Judas viviam elos de amizade, de confiança, de
esperança entre si.
De repente, rompe-se tal aliança e Judas entrega
Jesus aos adversários.
Com a traição, Judas passou da amizade para
a decepção, para a desilusão, para a perda de vinculação até a entrega.
Processo lento que foi minando o seu coração, até que ele se corrompeu, a ponto
de renegar a amizade e trair.
- Quando Jesus, na Última Ceia anuncia que um deles
vai lhe entregar, todos ficam “assustados”, “olham-se mutuamente”, mas não
conseguem identificar o traidor.
Os traidores não têm um rosto especial; qualquer
rosto vale para dissimular a traição do coração; qualquer rosto vale para
esconder um coração traidor.
Judas, em nada dava sinais de ser diferente do
restante dos discípulos. Por isso ninguém se atreveu a acusá-lo de traidor.
Parecia tão normal como qualquer outro do grupo.
É que as traições são alimentadas e escondidas no coração; as traições não têm rosto, não são visíveis. Por isso mesmo, os traidores, são tão difíceis de serem reconhecidos. Caminham como todos. Comem como todos. Sorriem como todos. Têm cara de amigo mas, por dentro, carregam um coração vendedor de vidas, de dignidades.
- Poucas experiências destroem tanto alguém por
dentro como a traição.
Quem traiu e quem foi traído assume reações semelhantes, como esvaziamento da afetividade, sensação de inutilidade vital, desorientação, perda do sentido da própria existência, angústia, pânico, fobias e medos generalizados diante das pessoas e do mundo. A traição desmonta a esperança no outro ser humano e leva à descrença na existência do amor. A traição tira do ser humano sua capacidade de dar respostas à vida, de envolver-se num projeto e num ideal maior, que ultrapasse o valor de sua própria vida.
- Pensemos em tantos “Judas institucionalizados”
que exploram as pessoas, alimentando uma “cultura
de morte”; pensemos nos “pequenos judas” que
carregamos dentro de nós, na hora de eleger entre
lealdade e interesse, entre gratuidade e dureza de
coração. “Cada um de nós tem a capacidade
de trair, de vender, de só optar em favor do próprio interesse. Cada um de nós
tem a possibilidade de deixar-se seduzir pelo amor ao dinheiro, pela busca de
poder. Judas, onde estás? É a pergunta que faço a cada um de nós” (Papa
Francisco).
+ Leia
atentamente o Evangelho da liturgia de hoje. Jo 13,21-33.36-38
+ Comece
a contemplação ativando todos os seus sentidos, para poder participar intensamente
da cena.
+ Faça-se
e sinta-se presente na sala da Última Ceia, como um “humilde servidor”: observe
o ambiente preparado, a disposição da mesa, o jarro e a bacia para o lava-pés,
os pães ázimos, ervas amargas, vinho...
+ Centre
sua atenção na chegada de Jesus e seus discípulos; observe as feições de cada
um deles, tomando lugar à mesa... Procure escutar o que estão dizendo...
+ À
meia-distância, observe a seriedade do momento, escute as palavras de Jesus ao
tomar o pão e o vinho... Sinta-se desconcertado quando Jesus anuncia que um do
grupo vai ser o traidor. Veja as reações dos discípulos, a tristeza de Jesus...
+ Diante de “Jesus
traído”, recorde experiências pessoais de traição: quando foi traído? Quando
traiu? Como se sentiu?
+ Passe
um bom tempo nesta sala, onde está acontecendo um evento histórico e essencial
para os seguidores de Jesus: a instituição da Eucaristia. Participe também você
da refeição.
+ No
final da oração dê graças por poder participar deste momento.
- Faça
exame da sua oração e registre no “caderno de vida” os movimentos (moções) do
coração.
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