Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj (Centro de Espiritualidade Inaciana), como sugestão para rezar e meditar os acontecimentos da Semana Santa: SÁBADO SANTO.
“... depois,
rolou uma pedra na entrada do túmulo” (Mc 15,46)
+ Podemos começar este dia recordando uma
experiência muito humana: imaginemos o regresso do enterro de uma pessoa
querida, depois de uma longa temporada de lutas e temores, com um tratamento
pesado, com momentos de otimismo, momentos de frustração, etc..., até o
instante último em que dizemos em nosso interior: “descansou”.
Quem
não regressou alguma vez do cemitério com esta sensação?
Partindo
desta experiência, contemplemos um momento como descem do Gólgota, Maria, o
discípulo amado e algumas mulheres que estavam junto à Cruz, com a horrível
sensação de que tudo acabou.
+
Hoje é Dia de silêncio:
recordar os grandes silêncios da vida (perdas, fracassos, crises...) onde
não há razões, mas no silêncio profundo, algo novo começa a germinar...
- Normalmente o Sábado Santo
não merece maior atenção de nossa parte; acabada a Sexta-feira Santa já
pensamos no Domingo da Ressurreição. No entanto, o Sábado Santo reivindica uma
reflexão e um lugar na nossa vida espiritual.
O Sábado Santo é um dia de
penumbra: entre a sombra da Sexta-feira e a luz do Domingo. É o dia do luto e
da possível boa notícia, da espera e da esperança. É o dia dedicado à solidão
de Maria, o “dia não-litúrgico”. É o dia em que Jesus “desce” à morada dos
mortos, na obscuridade mais absoluta. Ali não há visão de Deus; por isso, a
Escritura a chama “inferno”.
É o dia do ocultamento de Deus, do silêncio de Deus Pai, da grande solidão de Jesus, do Filho perdido na obscuridade, na “terra de ninguém”. Jesus no túmulo simboliza o silêncio, a volta ao mais íntimo de si mesmo, abraçando a solidão sem se sentir solitário.
- Se não oramos a partir desse silêncio, é porque ainda não
mergulhamos no mistério do Amor compassivo. Muitas vezes negamos a Deus o que
de mais humano há em nós: o poder fazer comunidade compassiva e solidária,
compartilhando a dor e o luto.
O Pai está de luto; a humanidade
inteira está enlutada devido à pandemia; toda a natureza, em silêncio, acolhe a
semente do Corpo do Verbo, na esperança de germinar Vida plena.
Contemplemos a espera angustiada do mundo, dos
povos, das pessoas. Contemplemos o mundo e a humanidade em seu sábado santo, em
seu dia de silêncio, em seu isolamento social.
Esse parece ser o estado da humanidade neste momento; um estado de paralização e de espera que parece não ter saída. Envolve-nos a obscuridade; estamos no túnel e não vemos a saída. O corpo da humanidade encontra-se ferido, des-vitalizado. Não é a morte, mas tampouco é a vida.
- Nosso
mundo carrega a cultura da morte, do ócio, da violência, da intolerância...
Toda a criação geme em dores de parto, esperando vida plena.
Em meio a tantas trevas, só há
uma pequena luz que permanece acesa da casa do discípulo amado, na casa daquele
a quem Jesus confiou sua Mãe, no
momento de sua morte. A Mãe é o símbolo da esperança no Sábado Santo. É o dia
“mariano” por excelência. Nunca, como neste dia, ela se sentiu tão só, tão sem
corpo. Mas, com certeza, o Abbá de Jesus tinha para ela um segredo, um advento
inesperado: o momento de exclamar: “tu és
o meu Filho, eu hoje te gerei” (Hb.
1,5).
As mães geram a vida; por isso, custa-lhes crer na morte. Maria continua crendo na vida; ela é mãe demais para esquecer. Seu filho é muito Filho para morrer.
- Sábado
Santo é tempo não só de espera, mas de esperança,
é deixar que o grão de trigo morto comece a dar fruto, é tempo de um inverno
que tornará possível as flores da primavera, é tempo de imaginar, de criar, de
abrir-se a algo novo e inesperado, de sonhar um mundo melhor e uma Igreja mais
nazarena.
Este espaço de silêncio não é de morte senão de vida germinal, é noite que aponta à aurora, são as noites escuras da vida que desembocam na alegria da alvorada; é tempo de fé e de esperança, é momento de semear, mesmo que não vejamos os resultados, é tempo de crer que o Espírito do Senhor, criador e doador de vida, está fecundando a história e a terra para seu amadurecimento pascal e escatológico, para a terra nova e o céu novo.
- A Luz está para chegar. O Espírito
ficou sem palavra, mas já sussurra. A voz do silêncio já geme; nele
vislumbra-se a chegada da Vida. Algo grandioso se prepara.
Da escuridão da morte do Filho de Deus
brota a Luz de uma esperança nova: a luz da Ressurreição reflete-se
no rosto de Maria. Nossa amizade e devoção a Maria da esperança, a transparência
feminina do Espírito, nos mantém no ritmo da espera.
Aproximam-se os rumores de ressurreição.
É Páscoa.
Não basta re-nascer; é preciso assumir
nossa condição de responsáveis de uma Nova Vida.
Texto bíblico: Mc 15,42-47
+ É preciso, com Jesus, descer ao túmulo de nossa interioridade,
transitar por espaços e dimensões não integradas e nem pacificadas. Só quem
mergulha nas profundezas de sua existência é capaz de morrer às exigências do
“ego” e vislumbrar as potencialidades de vida que ainda não foram ativadas. “Se o grão de trigo que cai na terra, não morre, fica só” (Jo 12,24).
+ É preciso envolver este “sábado santo da vida” com os perfumes
da compaixão, solidariedade, comunhão...
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