“Sede misericordiosos, como também
o vosso Pai é misericordioso” (Lc. 6,36)
Tornar presente o Pai como Amor e Misericórdia foi, para Jesus, o cerne de sua missão: toda
a sua vida foi uma eloquente demonstração da misericórdia divina para com a humanidade.
Jesus, que encarna e torna visível no mundo a misericórdia do Pai, se faz também
misericordioso. Anuncia aos pecadores que eles não estão excluídos do amor do
Pai, mas que Ele os ama com infinita ternura. O Evangelho só aparece como Boa-Nova se compreendermos esta
novidade introduzida por Jesus.
Ele, em sua
presença misericordiosa, revela um Deus desprovido de dogmatismos, de controle
e de poder. O Deus de Jesus não é um juiz com um catálogo de leis que tem
necessidade de mandar, controlar, verificar; o seu Deus é o Deus da misericórdia, da bondade sem limites e da paciência
para com todos.
Jesus propõe
um modo de ser humano inseparável da
misericórdia do Pai:
“Sede misericordiosos como o Pai é misericordioso” (Lc 6,36)
Ser misericordioso “como” Deus constitui o mais elevado convite e a mensagem mais
profunda que o ser humano recebe sobre como tratar a si mesmo e aos outros.
Deus,
em sua misericórdia reconstrutora,
libera em nós as melhores possibilidades, riquezas escondidas,
capacidades, intuições... e nos faz descobrir em nós, nossa verdade mais verdadeira de pessoas
amadas, únicas, sagradas, responsáveis... É ele que “cava” no nosso coração o
espaço amplo e profundo para nos comunicar a sua própria misericórdia.
A força criativa do seu amor misericórdioso põe em movimento os grandes dinamismos de nossa vida; debaixo do
modo paralisado e petrificado de viver, existe uma possibilidade de vida nova nunca ativada.
A experiência de misericórdia gera em nós uma
atitude correspondente de misericórdia. O Deus miseri-cordioso cria em nós um coração novo, feito de acordo com o Seu, capaz de misericórdia (“bem-aventurados os
misericordiosos porque alcançarão misericórdia”). É
exatamente este o maior sinal da sua Misericórdia: ama-nos a ponto de enviar-nos ao mundo como instrumentos de Sua reconciliação, pondo em nosso coração um Amor que vai além da justiça.
A misericórdia é não só o atributo
primeiro de Deus, mas também a mais humana das virtudes. É aquela que melhor
revela a natureza do Deus Pai e Mãe de infinita bondade. É a que revela
igualmente o lado mais luminoso da natureza humana. Por isso é a que mais
humaniza as relações entre as pessoas.
A misericórdia
presente em nós é modelada e alimentada pela Misericórdia divina, que se visibiliza no perdão, na compaixão, no
consolo, na ternura, no cuidado...
Nossa atitude misericordiosa nos configura à imagem do Deus
misericordioso. É onde somos mais seme-lhantes
a Ele. A misericórdia como
estilo-de-vida cristã nos descentra de nós mesmos e nos faz
descer em direção ao outro, numa atitude de pura gratuidade. A vivência da
misericórdia nos torna realmente livres, e isso nos proporciona profunda
alegria interior.
Uma misericórdia
superabundante, generosa... é gesto gratuito e positivo de encontro, de acolhida, de
cordialidade, que se torna hábito de vida: ser “presença misericordiosa”.
A espiritualidade da misericórdia
contém em si a gratuidade do relacionamento, a dimensão
desinteres-sada da doação. É a partir da misericórdia que a pessoa é capaz de amar os inimigos, de fazer o bem aos que a odeiam, de bendizer os que a amaldiçoam,
de oferecer a outra face, de emprestar sem espe-rar recompensa, de perdoar sem
limites...
A misericórdia
é humilde e não humilha, porque é discreta e silenciosa. Ser presença
misericordiosa não significa pôr o outro de joelhos para que reconheça seus
erros; ela nasce de um coração “educado” pela Misericórdia divina e
se manifesta externamente com uma atitude mansa e condescendente.
Essa Misericórdia é uma força poderosa, não se
rende diante do mal, porque é sempre capaz de redescobrir o bem ou de salvar a intenção do próximo, de abrir-lhe novamente a esperança...
Entrar no movimento
da misericórdia humaniza e cristifica essencialmente a pessoa, porque a
miseri-córdia constitui “a estrutura fundamental do humano e do
cristão”.
Fundamentalmente,
a misericórdia significa assumir
como própria a miséria do outro,
inicialmente como sentimento que
comove, mas que, logo em seguida, leva à ação.
Ela brota das “entranhas” e se dirige instintivamente ao próximo na forma de proximidade, acolhida e compaixão.
Misericórdia é exatamente: “ter
coração” para o
outro, dando preferência aos pequenos e pobres.
A misericórdia
é a caridade que “toma
mãos e pés”, ou seja, o amor
que se expressa em uma ação de-
cidida e generosa, capaz de transformar e libertar.
Em hebraico, a palavra “misericórdia”
– “rahamim”, significa ter entranhas como uma mãe.
É comover-se
diante da situação de fragilidade do outro; é sentir-se intimamente afetado
e, por isso, com a disposição de ser magnânimo, clemente e benevolente para com
ele.
A misericórdia recebida e experimentada é
a base da atitude compassiva, não como ato ocasional mas como estilo
de vida evangélico. Torna-se o fundamento e a perene inspiração de uma
existência de par-tilha e solidariedade.
Ser presença misericordiosa é um “modo de proceder”,
um “estilo de vida” que não está ligado a uma transgressão; é muito mais um estilo de bondade, compreensão,
magnanimidade, estilo de quem não se fixa no que o outro merece nem se
escandaliza com sua miséria.
"Devemos ser presença misericordiosa como pecadores, e não como justos”.
A misericórdia
é fundamentalmente uma mensagem de estima
e confiança no outro, crer na sua
amabilidade. Por isso, a presença misericordiosa é força que provoca no outro a
re-descoberta de sua própria identidade (uma pessoa amada e acolhida pelo Deus
misericordioso) e ao mesmo tempo desata nele as ricas possibilidades de vida
que estavam latentes.
Quem é misericordioso está convencido de que o
irmão é melhor que aquilo que
aparenta ser.
A misericórdia é expansiva, ela abre um
novo futuro e ativa os melho-res recursos no interior de cada um. Ela não se
limita ao êrro, mas impulsiona o outro a ir além de si mesmo.
Onde não
há misericórdia, não há sequer
esperança para o ser humano.
Textos bíblicos: Lc 6,27-38
Na oração:
- Pedir
maior consciência do Amor Misericordioso do Pai por você; que você possa
deixar-se surpreender pelo Amor criativo do Deus Pai/Mãe... e participar em sua
festa de reconciliação.
- Ao mesmo tempo, pedir um coração “desarmado”,
pronto a re-criar (perdoar é
re-criar, é dar oportunidade para alguém viver de novo).
- Entrar no “fluxo” da
misericórdia divina: ser canal por onde ela circula para chegar até os outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário