Apresentamos a seguir o texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj (Centro de Espiritualidade Inaciana - CEI), como sugestão para rezar o Evangelho do 4º Domingo do Tempo de Advento.
“Quando Isabel
ouviu a saudação de Maria, a criança pulou no seu ventre...” (Lc 1,41)
Os sinais da quarta Semana do Advento nos devolvem à beleza do
pequeno, à humildade do cotidiano, à simplicidade dos encontros. No mistério da
Visitação, uma simples saudação,
essa experiência universal de acolhida do outro, desencadeia uma torrente de
comunicação entre duas mulheres grávidas que se enchem de júbilo, bendizem e se
alegram juntas enquanto a vida cresce em suas entranhas.
No encontro entre Maria e Isabel a comunicação abarca,
com igual intensidade, tanto a dimensão corporal como a que se expressa em
palavras. Nesse clima de confiança total acontece o diálogo entre elas. Duas
mulheres que compartilham um segredo que não são capazes de entrever em toda
sua imensidade, carregada de transcendentais consequências. E nessa efusão de
duas pessoas simples, unidas pelo sangue e sobretudo pela fé, se reconhecem
partícipes de uma história que as ultrapassa. Encantadas, agradecidas, maravilhadas,
expressam os sentimentos de seu coração no louvor a Deus. “Minh’alma
engrandece o Senhor” é a primeira mensagem do
Magnificat com que nos evangeliza aquela jovem simples de Nazaré que guardava
em seu coração todas as coisas que iam acontecendo.
O evangelho da Visitação
nos convida a contemplar como Maria
saiu de sua casa e empreendeu apressadamente uma viagem; viagem que é metáfora
de todas as viagens da existência humana. Maria disse “fiat” a Deus, pôs-se a
caminho e foi renovando cada dia de sua vida esse arriscado e confiado “sim”. Advento,
tempo de espera no qual Maria é protagonista, guardando um segredo que afetará
a todos nós. O que a move a sair é um grande projeto que vem do alto. Assim ela
nos revela que não se pode viver sem mistério, sem paixão; que o mistério nos
deslumbra, nos supera e nos dinamiza.
Em Isabel, podemos admirar como se une o
assombro por uma maternidade inesperada com a ação do Espírito atuando sobre
sua esterilidade. Seu assombro e exaltação ecoam com a alegria e a dança da
criança que carrega em suas entranhas. Isabel, a mais velha, se inclina diante
de Maria, a mais jovem, num abraço e num beijo acolhedor. As duas são
portadoras de mistério; estão profundamente marcadas pela comoção. Nelas tudo é
surpresa, vibração e alegria.
Isabel
e Maria não só se acolhem e se
animam, mas se acompanham e se ajudam. O acompanhamento entre ambas se converte
em fonte de bênçãos.
Maria descobre que não se encontra sozinha; há uma mulher que lhe
acompanha.
Ela quer compartilhar sua
experiência de mulher (e futura mãe) com outra mulher, sua “prima” Isabel, a
mãe do Batista. Maria vai ao encontro de
Isabel para sentir o apoio na figura de uma mulher madura, mas cheia de vida e
de futuro. Não se dirige ao Templo nem ao sacerdote...Os homens de então não
são capazes de entender o que está acontecendo nestas duas mulheres, pois estão
preocupados com outras coisas. Maria precisa dizer para outra mulher, para
celebrar com ela “a maravilha que
Deus estava realizando nela”. Toda a história da
esperança humana, a humanidade inteira se condensa em duas mulheres.
Ambas, tocadas pelo
Espírito, seguem sua própria evolução: cada uma tem sua gravidez, e isto requer
cuidado, proteção, equilíbrio...
Assim, as duas unidas
caminharão em direção a um maravilhoso futuro desconhecido. O novo precisa
companhia, unir mãos e corações, mentes, forças e pés. Cada uma com seu segredo
dentro de si, presente em suas entranhas. As duas com uma forte convicção: foram
visitadas pela misericórdia de Deus.
Em nome do filho que
dança no seu ventre e tomando a palavra dos grandes sábios da Antiga Aliança,
como encarnação da esperança do povo israelita que aguardou este momento
durante séculos, Isabel canta a
grandeza da mãe do Messias: “Bendita tu
entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre!” “Bem-aventurada aquela
que acreditou, porque será cumprido o que o senhor lhe prometeu”.
Esta é voz de benção, ou seja, de graça criadora e
abundância. Esta é a benção e a bem-aventurança que dirigem a Maria todos os
“esperantes” do Antigo Testamento. Esperaram longos séculos, dirigidos, animados,
pela voz dos profetas. Agora podem sentir-se satisfeitos. Chegou o cumprimento
e assim o confirma, em nome de todos, Isabel, mulher israelita, mãe profética.
É verdade que as
bênçãos eram comunicadas pelos sacerdotes. No entanto, Isabel bendiz Maria em
sua plena juventude e grávida de Deus. Bendiz o fruto de suas entranhas. Só
esta mulher que engendrou em sua velhice, assumindo a voz do profeta que
carrega em sua entranha, pode entender e receber a mãe messiânica, proclamando
sobre ela a grande voz do cumprimento dos tempos. Estamos no centro da oração
mais querida dos cristãos católicos (depois do Pai-Nosso), que é a Ave Maria.
Maria recebe
agradecida as palavras de benção e lhe responde dando graças a Deus com o Magnificat.
Advento é o tempo das
mulheres,
ou seja, daquelas que tem uma surpresa a oferecer, pondo-se a serviço do amor
de Deus que levam em seus ventres, amor que as envolve e as transcende,
fazendo-as servidoras da vida.
A cena da Visitação nos situa em um espaço
intenso de mulheres. É como se, ao chegar o momento culminante da revelação, os
varões passassem a segundo plano. Certamente, realizaram e em algum sentido
continuam realizando funções socialmente importantes: fazem negócios, servem
como sacerdotes no templo, estudam e explicam o sentido da lei como escribas,
definem e encarnam a pureza do povo eleito como os fariseus...
Esses e outros
ofícios de varões foram e são valiosos; mas ao chegar a plenitude dos tempos
acabam se tornando secundários, pois Deus não precisa de sacerdotes, nem de
fariseus, nem escribas, como os antigos. O cuidado da vida e a vida mesma do
Messias de Deus, como futuro salvador da humanidade, está em mãos de mulheres.
Também a Igreja hoje deve viver “em
tempo de “parto”, pois carrega em seu ventre Alguém maior que ela
mesma; ela só poderá “dar à luz” a Deus na história da humanidade se renunciar
às suas grandezas externas, feitas de riquezas e privilégios, de honras e
poderes... e revestir-se da simplicidade, da ternura e da acolhida amorosa.
Para isso, ela precisa pôr-se a caminho, para visitar e dialogar com Isabel e
com outras mulheres, e aprender com elas o que significa estar a serviço da
vida, que a ultrapassa sempre.
Este ícone da Visitação des-vela o modo original de
ser e de agir de toda a comunidade eclesial; há diversidades de serviços que a
caracterizam, mas todos são convidados a reconhecer, a servir, a celebrar as
maravilhas que Deus continuamente realiza em tudo e em todo.
É um ícone dinâmico
que nos lança a “sair apressadamente” ao encontro do outro, com quem temos um
parentesco, na consciência de que fazemos parte de uma mesma humanidade.
A vida cristã de
nossos dias precisa voltar à Visitação, reviver a “cultura do encontro” e
buscar inspiração nas protagonistas no evangelho deste domingo. A vida cristã necessita
Visitação para ser mais vida e mais cristã, para deixar seguranças, cuidar e
acompanhar a vida que há nela e nas “periferias existenciais”, ali onde o novo
está germinando, para espanto e surpresa de todos.
Com a Visitação nos
chega memória agradecida, paixão comprometida e esperança dinamizadora de um
possível presente fecundo. A Visitação é um foco criativo de espiritualidade.
Texto
bíblico: Lucas
1,39-45
Na oração:
Advento nos inunda da alegria da
Visitação e nos move a ser portadores e portadoras da Vida de Deus para o nosso
hoje.
- Você visita ou se deixa visitar
por quem é diferente? Ou assume posturas de preconceito e intolerância?
- Através das “redes sociais”
visitamos tantas pessoas: suas visitas virtuais são cheias de graça e alegria
ou carregadas de julgamento, de mensagens pessimistas...?
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