Durante o mês de julho publicaremos semanalmente um texto para celebrar a vida e memória de Santo Inácio de Loyola. Esse texto também estará disponível em áudio (podcast) no canal Rezando o Evangelho no Spotify e em outras plataformas de áudio. O quarto e último texto aborda uma reflexão sobre a vivência da Espiritualidade Inaciana no nosso cotidiano, mais um legado de Santo Inácio de Loyola que permanece e gera frutos até os nossos dias. Boa leitura! Que Santo Inácio nos ensine a ser e buscar sempre o Magis!
Vivemos mergulhados na cultura de resultados; o ativismo é o nosso estilo de vida; a existência inteira faz-se maquinal e rotineira; a vida perde seu sentido; já não encontramos tempo para desfrutar das atividades mais simples e humanas; nosso cotidiano torna-se pesado, cansativo, passa a ser rotineiro, convencional e, não raro, carregado de desencanto. A maioria das pessoas vive restrita ao cotidiano com o anonimato que ele envolve. Tal situação acaba gerando pessoas ansiosas, irritáveis, frustradas.
O que
fazer então?
Quando a vida cotidiana se torna monótona e se faz normal, é necessário sacudi-la com algum “detalhe anormal”, que ajuda a revigorá-la e dar-lhe fecundidade. “Se, às vezes, há um fastio na rotina, não raro ela revela um mistério insondável” (Cláudio Van Balen). A mística inaciana desperta nossa atenção para o mistério das pessoas, das coisas, da normalidade da vida. Santo Inácio, quando nos convida a contemplar a “vida oculta” de Jesus, no fundo ele quer que coloquemos em evidência nossas motivações, nossos valores, nossos critérios.
Jesus
nos ensina, em Nazaré, a descobrir o valor eterno do doméstico, do cotidiano.
Ele
nos ensina a saborear o eterno e o Absoluto nas pausas e nos silêncios da
vida cotidiana. Ele gasta praticamente toda sua vida nesta humilde
condição; passou despercebido como Messias. Identificando-se com a vida de todo
mundo, Jesus mostrava que a salvação não consistia em coisas extraordinárias ou
em gestos fantásticos, mas na “adoração do Pai em espírito e verdade”.
Tanto
em Nazaré quanto na vida pública, Jesus nos comunica uma profunda união com o
Pai. Para Ele o Reino se revela no pequeno, no anônimo, no cotidiano e não no
espetacular, no grandioso. Para Ele, não são as coisas que nos fazem
importantes, mas somos nós que fazemos qualquer coisa ser importante. É o
sentido que damos à nossa vida e à nossa ação que fazem com que estas sejam
significativas ou não. É a importância do não importante. “Não vos preocupeis
com o dia de amanhã, pois o dia de amanhã se preocupará consigo mesmo. Basta a
cada dia a própria dificuldade” (Mt. 6,34). Com estas palavras, Jesus
estabelece a diferença entre o modo pagão e o modo cristão de viver o
cotidiano. A cotidianidade de nossa vida está tecida de coisas ordinárias e não
de coisas extraordinárias. Falamos de uma cotidianidade humana, isto é,
daquelas atividades de nossa vida diária, que embora irrelevantes em sua
aparência, tem uma razão de ser, uma motivação e um modo de fazer-se que não se
deve à mera casualidade ou a um impulso instintivo de repetição e automatismo.
O
cotidiano é o que vivemos e/ou fazemos cada dia: o conjunto de circunstâncias,
atividades e relações que formam a trama da vida de uma pessoa por meio das
quais Deus atua nela e a pessoa se relaciona com Deus. As ações cotidianas
insensatas podem ser sensatas se percebermos Deus presente nelas. Descobrir a
presença divina escondida no cotidiano é encontrar-se acolhido pelo abraço do
Criador que nos envolve. Quando a pessoa assume seu cotidiano e o vivifica com
injeções de novidade, de idealismo, de criatividade, então começa a irradiar
uma rara energia interior.
A essa força denominamos de carisma, que significa a energia que tudo vitaliza, que tudo penetra e rejuvenesce. O carisma inaciano nos desperta da letargia do cotidiano. E despertos, descobriremos que o cotidiano guarda segredos, novidades, mensagens ocultas, que podem acordar e conferir sentido e brilho à vida.
O
cotidiano passa a ter sabor de eternidade.
O cotidiano é o meio pelo qual o amor toma densidade e se expressa preferentemente. Tem-se dito que “a humildade do amor é o dom da vida cotidiana”, ou seja, a humildade do amor sem brilho, no escondido. O amor é, precisamente, o lubrificante que dá sentido à vida cotidiana e lhe faz superar as dificuldades inerentes à mesma: o desprendimento de si mesmo, a busca da verdade e do bem comum, a atenção ao que facilita a vida dos outros, se tornam normais quando se cultiva o amor. E é esta fidelidade no cotidiano que possibilita a transformação da realidade.
Proposta de reflexão: Faça pequenas pausas durante o seu dia: pela manhã, no início da tarde, no início da noite... Procure perceber os milagres, o sagrado nas coisas simples, os passos da presença divina em suas vivências humanas cotidianas.
Fonte:
Magis Brasil. Reflexões Inacianas: Espiritualidade do cotidiano criativo,
Disponível em: https://magisbrasil.com/reflexoesinacianas18-20181204
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