Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, SJ (Centro de Espiritualidade Inaciana), como sugestão para rezar o Evangelho do 11º Domingo do Tempo Comum (Ano B).
“...e
a semente vai germinando e crescendo, mas ele não sabe como isso acontece” (Mc 4,27)
O mundo no qual
vivemos, feito de códigos e números, de tecnologia e de anonimato, de frios
cálculos e de robots telecomandados..., conduz a uma vida em contínua
aceleração; isso faz com que todos adoeçam de ativismo, de competição, de
eficientismo; o excesso informações tira o sabor das coisas, instaura uma
cultura que não flexibiliza a vida interior e o recolhimento, não cultiva afetos,
emoções e sentimentos.
Tal como Marta, “andamos inquietos e perturbados com muitas coisas; mas uma só é necessária” (Lc 10.41). Precisamos nos conceder espaços de calma para provar a verdade,
contemplar a beleza, saborear os inestimáveis valores
presentes na gratuidade e no dom desinteressado, alimentar-nos de valores
humanos e cristãos que, impregnados de futuro, tornam bela a vida de hoje.
Os
tempos e os ritmos de vida mudaram muito. Nós estamos muito distantes da
quietude e da calma do mundo rural; hoje predomina a eficácia, a pressa, a
ansiedade. A eficácia sempre tem pressa. Mas as coisas da vida requerem tempo,
calma e sabedoria.
Os
evangelhos estão cheios de referência à vida.
As sementes também nos falam de vida. Um grão de trigo, um grão de mostarda são
sementes humildes, pequenas, mas cheias de vida. A vida da semente é calada,
silenciosa, paciente: vai crescendo pouco a pouco, desenvolvendo toda sua
vitalidade.
A vitalidade da semente não depende do
trabalho e dos esforços humanos; ela está cheia de vida em si mesma. As
sementes, as plantas, as árvores não crescem de uma vez só, nem com saltos
espetaculares, mas pouco a pouco, humildemente.
O agricultor não escava desesperado a
terra, forçando o crescimento da semente que ali deixou, mas distancia-se dela
sabendo que há um tempo necessário de separação para que a planta, no seu
ritmo, possa nascer e crescer. Toda semeadura supõe que é preciso saber esperar
(esperança) com calma e paciência.
Não podemos ter urgências morais, nem
precipitações nas mudanças pessoais, sociais, pastorais..., porque pode nos
invadir a ansiedade e esta pode gerar medo, angústia..., pois pretendemos
solucionar as coisas com uma insaciável pressa e avidez.
O ser humano pós-moderno
está perdendo o contato com o cosmos, com o chão, com os animais, com a
natureza... e isto provoca-lhe todo tipo de mal-estar, de doenças, de
insegurança e de ansiedade.
Prestemos
atenção aos diferentes ritmos na sinfonia da vida. A natureza tem seus ritmos:
o do dia e o da noite, as quatro estações, o crescer das espigas, o canto dos
pássaros, o transcurso de um rio... Nossa vida tem os seus ritmos e somos
chamados a distingui-los: se uma mulher está grávida, viverá um ritmo; se
alguém está enfermo, descobrirá outro ritmo diferente; quem vive um luto por
uma separação ou por uma morte, terá outro ritmo...; a amizade, o estudo, o
trabalho... marcam ritmos diferenciados. Não se pode comparar o ritmo de uma
criança com o do ancião, ou do adolescente com o ritmo do adulto. É diferente o
ritmo do Sul e do Norte, o ritmo de cada povo....
Quando
forçamos o tempo biológico para apressar demais o passo e antecipar recursos
para uso imediato, o gasto de energia envolvido na operação pode arruinar a nossa
própria vida.
Há
um defeito na atividade que costuma tirar de nós a riqueza espiritual e
convertê-la num “ativismo insensato”, sem vida interior e sem criatividade.
Trata-se da ansiedade.
O nosso “eu profundo”
é ferido por um permanente estado de alerta, exigências de obrigações pendentes
e expectativas à espreita. Estamos perdendo aquela paz essencial nas
profundezas do nosso ser, aquele repouso sem preço na qual os elementos mais
delicados da vida se renovam e se confortam.
As demandas, a tensão, a
pressa da existência moderna, perturbam a destroem esse precioso repouso.
Este “nervosismo” chamado ansiedade
é uma espécie de pressa interior permanente. Sentimos uma necessidade imperiosa
de resolver rapidamente todos os problemas, como se todas as coisas fossem
urgentes ou indispensáveis. É um problema relacionado com o tempo.
Tratamos a vida com a mesma ansiedade que se abate
sobre nós nos cinzentos corredores de espera, nas filas administrativas, nos
engarrafamentos do trânsito. Tornamo-nos viciados em assuntos rapidamente
fechados, incapazes de acolher o surpreendente “novo” que o sabor da vida
insistentemente propõe.
Sabemos que, quando há ansiedade,
há desordem. Como a mente está cheia de projetos e vive antecipando-se
às coisas, nessa multidão de pensamentos reina uma grande confusão, e nada é
bem-feito.
Além disso, a ansiedade nos torna superficiais,
porque nos leva a passar rapidamente de uma atividade a outra, sem nos
aprofundarmos em nada. O coração ansioso não é capaz de deter-se em coisa
alguma. Não suporta a quietude. E assim não pode apreciar o sabor mais
agradável das coisas.
Há
no evangelho deste domingo um chamado dirigido a todos e que consiste em
plantar pequenas sementes de uma nova humanidade e de uma nova inspiração no
cotidiano de nossas vidas. Jesus não fala de coisas grandes. O Reino de Deus é
um dinamismo muito humilde e modesto em suas origens. Presença que pode passar
tão desapercebido como a menor semente, mas que é chamada a crescer e
frutificar de maneira inesperada.
É bom envolver-nos nas atividades
cotidianas e tirar maior proveito delas. Mas, às vezes, a ansiedade nos
leva a sermos demasiadamente dependentes dos resultados do trabalho. Queremos
ver rapidamente os frutos de nosso esforço. E assim escapa-nos o prazer de
podermos agir com serenidade e paz.
É necessário saber planejar e
prevenir, mas sem pretender prever e controlar tudo. É uma grande sabedoria
saber desfrutar das pequenas coisas que temos ou que podemos fazer agora, sem
pensar nas que não temos. Na ansiedade por querer conseguir certas coisas e
abarcar tudo, acabamos criando dependências egocentradas e a vida vai se
acabando sem ser vivida.
Então, nossa ação deixa de ser
fonte de satisfação e plenitude. Por isso terminamos nos enfraquecendo,
enchendo-nos de angústias inúteis e esquecendo-nos que
“com a divina consolação todos os trabalhos são prazer e todas as fadigas são
descanso” (Carta de Santo Inácio de Loyola a
Teresa Rejadel).
A familiaridade com Deus na relação com
todas as coisas do cotidiano, não implica fadiga ou ansiedade, senão que é uma
maneira de viver aquela paz e plenitude considerada como verdadeiro descanso.
Toda atividade humana,
perpassada por uma “espiritualidade” inspiradora, deve ser motivada, antes de
tudo, pela força interior do amor, que lhe dá uma qualidade, um sentido
e um valor particulares.
O desafio é buscar maneiras de encontrar a serenidade em meio às nossas frenéticas vidas, de abrir em profundidade nossa cotidianidade para poder nos submergir no ritmo tranquilo de Deus; encontrar-nos com Ele para que seja o centro de nossa vida e caminhar a seu lado. Oxalá sejamos capazes de captar os detalhes da paisagem de nossa vida para descobrir em tudo as pegadas do Senhor! E, embora vivamos neste mundo onde tudo se move tão rápido, podemos fechar os olhos e sentir que Ele nos conduz pela sua mão.
Textos bíblicos: Mc 4,26-34Na oração:
Tente escutar
o universo infinito; acima, abaixo, ao seu redor. Entre em profundo silêncio
para perceber a vibração de todos os elementos: terra, ar, água, fogo. Tudo
vibra, tudo está cheio de ondas luminosas, sonoras. Tudo é silêncio e tudo é
escuta. Sinta-se presente no meio deste diálogo entre céu e terra... para
escutar, falar e orar.
- Seu ritmo
cotidiano é marcado pela ansiedade, pressa, estresse...? Há espaço para o
silêncio, a contemplação?
- A partir do silêncio do seu coração, plante no seu cotidiano, sementes de humanidade: proximidade, acolhida, compaixão, paciência, paz...
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