“E Ele percorria os povoados da
região, ensinando”
(Mc 6,6)
“Adeptos (as) do Caminho”:
assim eram
conhecidos os(as) primeiros seguidores(as) de Jesus (At 9,2).
Assim
também quer Jesus que sejamos seguidores seus, sempre em caminho, em todos os
lugares, em todas as casas de passagem, dispostos a parar e conversar, prontos
ao encontro e à solidariedade com todos os que vão e vem pela vida.
Deveríamos
voltar a recuperar o sentido desta expressão (“adeptos do Caminho”), pois ela
nos convida a continuar percorrendo o caminho cotidiano da existência de uma
maneira cristificada; e isto é algo fundamental para o encontro profundo com o
outro, com as alegrias e os sofrimentos daqueles que se encontram às margens,
com a novidade e a surpresa da senda da vida, com o desafio de prosseguir confiando
na Boa Notícia de Jesus, que se manteve sempre em caminho pelas estradas da
Palestina, para levantar os feridos, oprimidos e excluídos do sistema social e
religioso.
Hoje como ontem, sair, caminhar, deslocar-se, ser itinerante... tem
sentido, porque significa ir ao encontro do novo e do diferente. “Sair” é também uma experiência
constitutiva da natureza humana porque tem um ar transformador. Cada um, ao
longo do caminho, experimenta “novos modos” de habitar a existên-cia, de
olhar-se, pensar e relacionar-se. A
itinerância permite ir mais além de si mesmo para encontrar outras maneiras de
viver, para entrar em outras terras prometidas, para aproximar-se de outras
pessoas, povos, culturas, onde encontrar
o sentido de vida; sobretudo,
possibilita ir ao encontro d’Aquele que nos transcende e sempre se
revelou Peregrino.
A vida
humana, neste sentido, é caminho,
com um ponto de partida, uma meta, um trajeto e um horizon-te.
Caminho, palavra
familiar e também humilde que evoca a existência de uma origem e um destino
e, entre ambos, de uma aventura: a
aventura de nosso caminhar, feita de desafios e extravios, e também de
encontros e de momentos inesquecíveis que nos confortam ao longo do percurso.
Todos
somos “peregrinos” neste “êxodo de nós mesmos para Deus”, no qual nos “adentramos em terra estranha, despojados dos
suportes usuais da existência, desprovidos de todo amparo que não seja o da
caridade...” (Tellechea Idógoras).
Quem caminha
calcula seu trajeto, suas próprias forças, fadigas, planeja suas paradas. Por
outra parte, decide correr o risco de sair de sua zona de conforto, para
abrirse à paisagem de novas relações, ao inesperado e inexplorado, a novos
encontros e sensações, a confiar e percorrer a própria existência.
O caminho é um processo de mudança
pessoal, um lugar pedagógico de cura, de aprendizagens, abertas ao assombro, a
um olhar dinamizador, à liberdade de pensamento e de ação. Ele nos move a
dilatar o coração e interessar-nos pela situação das demais pessoas, a
aproximarmos dos(as) samaritanos(as) que encontramos nas idas e vindas. Porque
o caminho é a ocasião, o Kairós, o tempo pedagógico de um movimento que
vivifica, deixa pegada e sabor de um outro sentir.
Podemos dizer que na Igreja são imprescindíveis
os itinerantes,
os peregrinos do Reino de Deus, como o próprio Jesus, que enviou discípulos e
discípulas pelos caminhos e povos, sem nenhuma estrutura de apoio a não ser um
coração disposto a não querer outra riqueza a não ser o fermento de nova
humanidade.
Com os itinerantes Jesus iniciou um
movimento a serviço do Reino e Ele mesmo foi um itinerante. Não permaneceu numa
casa, não se fechou em um lugar, não fundou uma instituição vinculada a um tipo
de templo, sinagoga ou santuário, mas foi percorrendo, com um grupo de
discípulos (as) /amigos(as), também itinerantes, os povoados e aldeias da Galileia,
anunciando e tornando presente o Reino. Jesus os tirou de seus lugares
estáveis, de suas simples redes da margem do mar, e os fez itinerantes através
de outros e amplos caminhos e mares, para assim encontrar-se com os
caminhantes, os perdidos e expulsos, e iniciar com eles a grande Marcha da
Vida.
Jesus, o Homem dos Caminhos,
chama para uma Vida nova. Chama na
vida e para a vida e põe as pessoas
em movimento, a caminho. A “pegada” que Ele deixa ao passar é
sua própria Vida partilhada.
Ele é o inspirador de
toda itinerância;
com sua peregrinação Ele abre possibilidade de outros caminhos.
Jesus, o
homem que se definiu, tem um sonho, um projeto (Reino). E surge diante dos
outros com força pessoal capaz de sacudi-los e colocá-los em movimento. Ele
“passa”
e sua presença os atrai arrancando-os da acomodação.
Faz-se do chamado um caminho, quando se partilha a vida com
quem chamou. Responder ao chamado feito por Jesus significa tornar esse chamado
um caminho de entrega e de serviço.
Jesus nos
apresenta uma causa muito nobre e, com seu chamado,
rompe nosso estreito mundo e desperta em nós ricas possibilidades, reacende
o que de mais nobre há em cada um e amplia nosso horizonte de vida. Para isso é
preciso sair dos templos que pretendem fechar e aprisionar o Espírito, para
dirigir-nos aos caminhos do mundo, para entrar em sintonia com o Coração e o
Manancial da Vida, “em espírito e verdade”, tocando a carne concreta da
Humanidade e da Mãe Terra.
“Chamado-resposta” implica, pois, um encontro comprometedor. O modo
de ser de Jesus, transparente e livre, ativa nossa vida atrofiada e estreita e
nos capacita a olhar amplos horizontes: seu povo, seu mundo dividido e
excluído... A ressonância de seu chamado nos predispõe a encontrar motivações
saudáveis e maduras que nos permitam peregrinar e viver no contexto atual com
amor, entusiasmo e criatividade.
Jesus envia seus discípulos com o
necessário para caminhar: cajado, sandálias e uma túnica. Não precisam de mais
nada para serem testemunhas do essencial. Jesus quer vê-los livres e sem
ataduras, sempre disponíveis, sem instalar-se no bem-estar, confiando na força
do Evangelho.
“O discípulo-missionário é um
des-centrado: o centro é Jesus Cristo que convoca e envia. O discípulo é
enviado para as periferias existenciais. A posição do discípulo-missionário não
é a de cen-tro, mas de periferias: vive em tensão para as periferias” (Papa Francisco)
Quê significa “fronteiras geográficas e existenciais”?
É preciso sair dos limites conhecidos; sair de nossas seguranças para
adentrar-nos no terreno do incerto; sair dos espaços onde nos sentimos fortes
para arriscar-nos a transitar por lugares onde somos frágeis; sair do
inquestionável para enfrentarmos o novo...
É decisivo estar dispostos a abrir espaços em nossa
história a novas pessoas e situações, novos encontros, novas experiências...
Porque sempre há algo diferente e inesperado que pode nos
enriquecer...
A vida está cheia de possibilidades e surpresas; inumeráveis
caminhos que podemos percorrer; pessoas instigantes que aparecem em nossas
vidas; desafios, encontros, aprendizagens, motivos para celebrar, lições que
aprenderemos e nos farão um pouco mais lúcidos, mais humanos e mais simples...
A periferia passa a ser terra privilegiada
onde nasce o “novo”, por obra do Espírito. Ali aparece o broto
original do “nunca visto”, que em sua pequenez de fermento profético torna-se
um desafio ao imobilismo petrificado e um questionamento à ordem estabelecida.
Texto bíblico: Mc. 6,7-13
Na oração:
-
Nas nossas vidas acontece algo de verdadeiro e belo quando nos dispomos a buscar
dentro de nós mesmos a razão da
nossa existência.
-
No “mapa
espiritual” de nosso interior ainda existe uma “terra desconhecida”, que proporciona interesse à vida, suscita
curiosidade, nos põe a caminho...
Grandes surpresas interiores estão à nossa espera, e a capacidade de
continuar procurando é que dá sentido
ao esforço e vigor à vida.
- A quê você se sente chamado(a)? A quem se
sente enviado(a)?
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