“E
vós, quem dizeis que eu sou?” (Mateus 16,15)
Nos evangelhos sinóticos, esta pergunta sobre a identidade de Jesus ocupa um lugar
destacado. Ela nos oferece as respostas do povo e da comunidade de discípulos, personalizados
em Pedro.
Como seus seguidores, devemos continuar nos
perguntar “quem é Jesus?”. Aqui não se trata do conhecimento externo da
pessoa de Jesus: quando e como viveu, quem são seus pais, em que cultura viveu,
qual era seu entorno social e religioso; nem sequer se trata de conhecer e
aceitar sua doutrina.
Nosso seguimento está fundamentado no Jesus que
encarna o ideal do ser humano querido por Deus, Aquele que nos revela, ao mesmo
tempo, quem é Deus e quem é o ser humano. Por isso, a pergunta que devemos
responder é: “quê significa
Jesus, para mim?”
É preciso deixar muito claro que não se pode
responder a essa pergunta se não nos perguntamos ao mesmo tempo: “quem
sou eu?” . O encontro com a identidade
de Jesus des-vela nossa própria identidade.
Na realidade, a pergunta pela identidade é a mais importante de todas aquelas que podemos nos
fazer: “Quem sou eu?” A rigor, essa é a primeira e essencial
pergunta. A resposta adequada à mesma nos liberta da ignorância, da confusão e
do sofrimento. Faz-nos livres e nos possibilita viver na luz.
Porque o objetivo de nossa vida não pode ser outro que
o de viver o que somos. E isso não é
algo que devemos “alcançar”, “conseguir” ou “conquistar”..., mas, simplesmente,
reconhecer. Trata-se de cair na conta ou compreender quem somos. Ao
compreender isso, emerge a plenitude, a sabedoria e a alegria.
Dito de outro modo: a causa de muitos sofrimentos
existenciais não é outra que a ignorância ou inconsciência de nossa identidade
profunda. O grande místico cristão do séc. XIII, Mestre Eckhart, repetia essa
expressão contundente: “Meu solo e o de Deus são o
mesmo”.
Em outras palavras: a Rocha é o divino que nos habita. No caminho do Seguimento de Jesus
vamos tirando os véus que bloqueiam e obscurecem nossa visão, permitindo que
aflore resplandecente nossa radiante identidade.
No evangelho de hoje,
Jesus revela sua identidade (“Messias,
o Filho do Deus vivo”) e, ao mesmo tempo, des-vela a
identidade de Pedro: “Tu és “petros” (pedregulho) e sobre esta “petra”(rocha)
edificarei minha igreja”.
Pedro se torna rocha firme (“petra”) quando se apoia na identidade de Jesus (a
verdadeira Rocha).
Pedro, que era “petros” (pedra de tropeço no caminho),
foi sendo transformado, através da identificação com Jesus, em “petra”, rocha firme da primitiva
comunidade cristã.
Dessa forma, o Simão
que era “petros”/pedra se converte em “Petra”/rocha firme, porque o mestre
des-velou a nobreza que estava escondida no coração dele, ou seja, sua
verdadeira identidade sobre a qual o mesmo Jesus iria edificar sua igreja.
Todo ser humano possui dentro de si uma profundidade que é o seu mistério
íntimo e pessoal; trata-se do “EU original”, aquele lugar santo, intocável, onde reside o
lado mais positivo da pessoa.
É aqui onde a pessoa encontra a sua identidade pessoal; trata-se do CORAÇÃO, da dimensão mais verdadeira de si, da sede das
decisões vitais, lugar das riquezas pessoais, onde vive o melhor de si mesma, onde se encontram
os dinamismos do seu crescimento, de
onde parte as suas aspirações e desejos
fundamentais, onde percebe as dimensões do Absoluto
e do Infinito da sua vida.
O próprio ser é a rocha consistente e firme, bem
talhada e preciosa que cada pessoa tem para encontrar segurança e caminhar na
vida superando as dificuldades e os inevitáveis golpes da luta pela vida.
Com confiança em si e na rocha do próprio interior
todas as forças vitais se acham
disponíveis para crescer dia-a-dia, para a pessoa se tornar aquilo que
originalmente é chamada a ser.
Descobrir a própria identidade pessoal é situar-se na linha
da orientação
e sentido da vida. A pessoa deve ter a capacidade de voltar
sobre si mesma e perceber por onde
está sendo conduzida e porquê. Concretamente, isso
pressupõe uma atitude de atenção e
escuta que permitem à pessoa situar-se diante do “para onde” e “para
quê”, diante da motivação básica do viver e do agir,
diante da “intenção” com que faz
as coisas...
“Viver em profundidade” significa “entrar” no âmago da própria vida, “descer”
até às fontes do próprio ser, até às
raízes mais profundas. Aí se pode
encontrar o sentido de tudo aquilo que é,
o porquê do que se faz, se espera, busca
e deseja.
“Descobrir a si mesmo” é descobrir que no próprio interior há um movimento
infinito de construção de si, de identidade em expansão... que se torna
possível graças a um constante arrancar-se do imobilismo e da paralisia existencial
que impedem o fluxo da vida.
Nossa existência não
pode ser de anonimato e indefinição. Ela exige identidade clara e bem definida.
Normalmente confunde-se
a identidade com certas “marcas
distintivas”: o nome, a profissão, a posição social, política ou religiosa,
a função...
A identidade, no entanto, é
dinâmica, histórica, fecunda, aberta ao desconhecido, aventureira...; ela é
lugar de expansão e de manifestação da livre circulação do impulso vital, que
faz de cada ser humano um “sopro divino vivo”.
Esse movimento não
permite mais que se responda à pergunta: “Quem sou eu?”, pois o ser humano
não é, ele se “torna”.
O ser humano é um contínuo “tornar-se”, um “vir-a-ser”, um “ek-sistir”,
capacidade de ir além de si e adiante de si, no movimento de infinita transcendência.
Só transcende quem se
aproxima da própria interioridade, do próprio coração.
Ter identidade
é viver em contato com as raízes que nos sustentam. Em contato com a fonte e na
viagem para dentro, clareia-se a visão de nós mesmos, da nossa originalidade e
dignidade.
Há uma força de gravidade que nos atrai
progressivamente para o mais profundo de nós mesmos, onde Deus nos espera e nos
acolhe, e onde encontraremos a nossa própria identidade e a verdadeira paz.
“Que
eu me conheça e que te conheça, Senhor! Quantas riquezas entesoura o homem em
seu interior! Mas de que lhe servem, se não se sondam e investigam” (S. Agostinho).
De “petros” a “petra”: esse é o des-velamento que
acontece em todo seguidor de Jesus quando escuta e vive sua Palavra, proclamada
no Sermão da Montanha.
Nossa identidade profunda é constituída pela
fragilidade/petros e pela fortaleza/petra. Só no encontro com Aquele que é a
Rocha firme é que transparece a “petra” que está oculta em nosso interior.
Texto
bíblico: Mateus 16,13-19
Na oração: A oração é
o caminho interior que faz a pessoa chegar
até o próprio “eu original”, aquele lugar
santo, intocável, onde reside não só o lado mais positivo da pes-soa, mas o
mesmo Deus. Este é o nível da graça, da gratuidade, da abundancia, onde
a pessoa “mergulha” no silêncio à
escuta de todo o seu ser.
Através
da oração a pessoa desce a uma
dimensão mais profunda e assim chega à corrente subterrânea.
Aqui
ela experimenta a unidade de seu ser.
Coloque-se diante da verdade de Deus, na verdade de si mesmo:
- Que resposta você daria, agora, se um repórter lhe entrevistasse e lhe perguntasse: “quem é você?”
- O que você colocaria na sua carteira de identidade que lhe diferenciasse de todas as outras pessoas? Quais seriam os seus sinais digitais mais originais? Quais os seus sinais digitais divinos? (as “marcas” de Deus);
- O que em você é “rocha” consistente, fundamento inabalável?
Coloque-se diante da verdade de Deus, na verdade de si mesmo:
- Que resposta você daria, agora, se um repórter lhe entrevistasse e lhe perguntasse: “quem é você?”
- O que você colocaria na sua carteira de identidade que lhe diferenciasse de todas as outras pessoas? Quais seriam os seus sinais digitais mais originais? Quais os seus sinais digitais divinos? (as “marcas” de Deus);
- O que em você é “rocha” consistente, fundamento inabalável?
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