Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, SJ, como sugestão para rezar o Evangelho do 6º Domingo da Páscoa (2023 - Ano A).
“...e Ele vos dará um outro Defensor, para que permaneça sempre convosco: o Espírito da Verdade”
Jesus
está se despedindo de seus discípulos; Ele os vê tristes e abatidos, pois, logo
não o terão presente entre eles. Quem poderá preencher este vazio da ausência?
Até agora, foi Jesus quem cuidou deles, defendendo-os dos escribas e fariseus,
sustentando-os na fé frágil e vacilante deles, ajudando-os a descobrir a
verdade de Deus e iniciando-os em seu projeto humanizador.
Nesta conversação
Jesus não só verbaliza o que pensa, senão que também expressa o que sente. O
grau de auto-revelação e transparência aumenta. Esta longa conversa é uma
oportunidade única para os discípulos conhecerem mais profundamente o Mestre;
ao mesmo tempo lhes é dado a chance de se conectarem com o significado nem
sempre consciente daquilo que Jesus quer dizer.
A conversação deixa, então, transparecer as
convicções, os sonhos, os sentimentos... de Jesus. “As palavras me escondem sem cuidado” (Manoel de Barros). Nesta maneira de conversar, Jesus
se manifesta tal e como é, verbalizando aspectos de si mesmo muito íntimos e
pessoais. A experiência do “nós” revela um significado especial de comunhão e
entrega.
Jesus
lhes fala apaixonadamente do seu Espírito; não os quer deixar órfãos.
Ele mesmo pedirá ao Pai que não os abandone, que lhe dê “outro defensor” para
que “esteja sempre com eles”. Jesus o chama “Espírito da
verdade”. Que se esconde nestas palavras de Jesus?
Para o quarto evangelho, o Espírito
é “outro Paráclito” porque aquelas comunidades do final do século I tem claro
que o “primeiro Paráclito” é o próprio Jesus.
O termo grego “Parakletos”, que se
costuma traduzir como “Defensor”, significa literalmente “aquele que está ao
lado”, para defender, apoiar, consolar, sustentar... Por esse motivo, alguém já
insinuou que a tradução mais de acordo seria tanto de “advogado defensor” como
de “assistente social”.
Uma
coisa é muito clara para o evangelista João. O mundo não vai poder “ver” nem
“conhecer” a verdade que se esconde em Jesus. Para muitos, Jesus terá
passado por este mundo como se nada tivesse acontecido; não deixará rastro
algum em suas vidas. Para conhecer Jesus é preciso ter olhos novos. Só aqueles
que o amam poderão experimentar que Ele está vivo, faz viver e chama ao
seguimento. “Conhecimento
interno para mais amá-lo e segui-lo” (S. Inácio).
Este “Espírito
da verdade” não deve ser confundido com doutrina, dogmas... Não se
encontra nos livros dos teólogos nem nos documentos do magistério da Igreja.
Segundo a promessa de Jesus, “o Espírito permanece junto de nós e está
dentro de nós”. Nós o
escutamos em nosso interior e resplandece na vida de quem segue os passos de Jesus
de maneira humilde, confiada e fiel.
É o
“Espírito da verdade” que desperta em nós os sentimentos mais elevados, os
desejos mais nobres, os recursos inspiradores... Ele tem a capacidade de fazer sintonizar
nosso coração com os sentimentos do coração do próprio Jesus.
Talvez
seja esta a conversão que mais precisamos hoje como seguidores (as): passar de
uma adesão verbal, rotineira e pouco real a Jesus para a experiência de viver
enraizados em seu “Espírito da verdade”. Afinal, somos seguidores de uma Pessoa
e não de uma religião ou doutrina.
Este
“Espírito da verdade” não nos converte em “proprietários” da
verdade; não vem para que imponhamos a outros nossa fé nem para que controlemos
sua ortodoxia. Vem para não nos deixar órfãos de Jesus, e nos convida a
abrir-nos à sua verdade, escutando, acolhendo e vivendo seu Evangelho.
Este
“Espírito da verdade” também não nos faz “guardiães” da verdade,
mas testemunhas. Nossa missão não é disputar, combater nem derrotar
adversários, mas viver a verdade do Evangelho e “amar a Jesus guardando seus
mandamentos”.
O “Espírito da verdade”
é Aquele que nos des-vela como verdadeiros; Ele nos sintoniza com a “verdade de
Jesus” e faz emergir nossa verdadeira identidade de pessoas originais, únicas,
sagradas...
Quem se deixa conduzir pelo
“Espírito da verdade” torna-se testemunho da verdade contra todo tipo de
calúnias, mentiras, intolerâncias, fanatismos. É extremamente incoerente quem
afirma se deixar conduzir pelo Espírito e atua como canal transmissor de
“fake-news”, julgamentos preconceituosos...
A
“verdade” se expressa assim como “testemunho” de vida interior. Temos ao
nosso lado o Grande Testemunho de Deus, que é Jesus. Podemos ser e somos
testemunhas de Deus uns para com os outros.
O
Deus de Jesus está presente no mais profundo de nosso ser, identificado com
nossa essência. Sendo Amor em nós não pode admitir intermediários. Isto não é
útil para nenhum poder ou instituição.
Mas
esse é o Deus de Jesus. Esse é o Deus que, sendo Espírito, tem como único
objetivo conduzir-nos à plenitude da verdade, a sermos verdade, verdadeiros,
autênticos. E aqui “Verdade”, ao contrário do que, muitas vezes pensamos, não é
conhecimento, mas Vida.
Enquanto
haja Espírito há alento e enquanto haja alento há vida. O Espírito é o alento,
a respiração do mundo. O Espírito enche a face da terra, penetra até o mais
íntimo dos nossos coração.
O
Santo Espírito da verdade nos faz respirar, viver, sonhar, amar, criar... O
Espírito, no aperto nos dá largueza, na enfermidade nos convida a crer na cura,
no caos nos torna criadores.
O Espírito nos foi enviado para que
seja o Alento do mundo; Ele é como rios de água viva para que haja vida e vida
em abundância; como labaredas de fogo, para que a energia se multiplique e tudo
funcione.
“Creio no Espírito Santo, Senhor e doador de vida!”. Esta confissão de fé não é uma
mera fórmula teológica. É o testemunho de uma experiência permanente,
histórica. Sem o “Espírito de Vida” a trama da história se revela inquietante e
deprimente. Sob o olhar do Espírito o diagnóstico é decididamente positivo.
Quando
nos deixamos acender com as chamas do Espírito, quando nos deixamos arejar pelo
vento impetuoso do Espírito, ou refrescar pelos rios de água viva, experimentamos,
em nós e nos demais, um florescimento inusitado de carismas, de dons, que
tornam possível o impossível; confiamos mais nos ritmos e tempos de Deus; celebramos
a existência de uma fonte de Água Viva que tudo fecunda, um Alento divino que
nos faz respirar, um Fogo de Deus que tudo energiza, um Espírito que nos guia
para o Paraíso, quando parece que tudo está perdido.
O Espírito Santo é a Respiração do
mundo. Tudo vive graças ao Espírito. E quando uma pessoa, cheia do Espírito,
morre, não o perde... mas o exala sobre os demais. Jesus ressuscitado exalou o
seu Espírito sobre os discípulos. Aqueles(as) que na terra deixaram as marcas
do bem, da verdade, da justiça, continuam exalando o Espírito sobre nós.
Queira o Abbá e Jesus conceder-nos, neste dia. a graça de respirar como convém e que, depois de enchermos os pulmões de Espírito, nos tornemos mais verdadeiros e esperançados.
Texto bíblico: Jo 14,15-21
Na
oração: A Igreja
correu o risco de entender a verdade como algo imposto de fora,
resolvido e ensinado desde cima. Mas Jesus promete aos seus um magistério
interior: os cristãos só conhecem a autoridade do Espírito-Paráclito,
que interpreta e atualiza a mensagem do Evangelho.
Corremos
o risco do engano, da manipulação de diferentes tipos. Pois bem, se confiarmos
no Espírito que vive dentro de nós, teremos a garantia da verdade. Esta é a
verdade interna, aquela que ilumina a vida, a partir do interior de Deus, que é
nossa luz.
-
No silêncio do seu coração, deixe-se ensinar e conduzir pelo Divino Mestre.
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