Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, SJ (Centro de Espiritualidade Inaciana), como sugestão para rezar o Evangelho do 33º Domingo do Tempo Comum (Ano B).
“Aprendei da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto” (Mc 13,28)
Estamos chegando ao final de mais um “ano
litúrgico” (este é penúltimo domingo), e a liturgia nos propõe leituras que,
fazendo referência aos “últimos tempos”, querem nos convidar à “vigilância” e a
atenção ao tempo presente.
O Evangelho de hoje é parte do cap. 13 do Evangelho
de Marcos, que contém um breve “apocalipse”, ou seja, uma revelação, um
des-velamento, um des-nudamento dos múltiplos véus que cobrem a realidade
humana, com suas contradições, incertezas, promessas e esperanças.
Devido às imagens que este gênero literário utiliza, com frequência atribui-se ao termo “apocalipse” um significado de “catástrofe” ou “destruição”. A realidade, no entanto, é diferente. Etimologicamente “apo-kalypsis” significa “destapar o que está escondido”, “tirar o véu”, “des-velar”, ou seja, “re-velação”.
No texto evangélico de hoje nos é revelado,
através de sinais (abalos celestes e terrestres, tribulações...), que esta
ordem das coisas (o “mundo”) vai ser renovado em profundidade. Tudo
desmorona à nossa volta, tudo vai desaparecer; mas o que o texto realça é a
contundente confiança na afirmação e na promessa de Jesus: “O
céu e a terra passarão, mas minhas palavras não passarão”. Ele trará a salvação de
Deus; não chegará com aspecto ameaçador.
A destruição anterior é a possibilidade de uma
construção mais profunda, fundada no Filho do Homem. Por um lado, o mundo velho
acaba. Mas, por outro, chega o ser humano verdadeiro, a humanidade de Deus.
Para quem crê, o mesmo “fim deste mundo” vai se converter em princípio de
esperança universal.
Por isso, as palavras de Jesus “não passarão”; não
perderão sua força salvadora; continuarão alimentando a esperança de seus
seguidores e serão sempre alento para os pobres.
As Palavras do Filho do Homem
constituem o nosso rochedo, são a nossa força; elas são o centro de nossa vida,
iluminando-nos e ativando nossos melhores recursos para acolher a novidade
radical do Evangelho.
O sol, a lua e os astros se apagarão, mas o mundo não
ficará sem luz. Será o Filho do Homem quem o iluminará para sempre,
estabelecendo a verdade, a justiça e a paz na história humana, tão marcada por
contínuas mentiras, injustiças e violências.
Nesse sentido, pode-se afirmar que, no final, não será preciso sol ou lua, porque o Filho do Homem será diretamente luz e vida para todos. Seus seguidores poderão ver finalmente seu rosto tão buscado: “Vereis o filho do Homem vindo nas nuvens”. Não caminhamos para o nada e o vazio. Jesus virá ao nosso encontro, para nos conduzir ao abraço do Pai de bondade.
Quando acontecerá tudo isto? Já, agora mesmo:
tudo está acontecendo. Estamos na noite que precede à aurora do dia do Homem,
da humanidade de Cristo. Devemos nos manter como servos vigilantes no tempo das
tribulações e das trevas deste mundo, cheios de esperança.
Jesus põe como sinal uma figueira. Estamos
na primavera/verão que precede o tempo dos bons figos, dos bons frutos. Neste
contexto podemos recordar o risco de sermos figueiras estéreis, sem frutos. E
Jesus está esperando os frutos de nossa figueira. Nós mesmos somos o sinal de
que deve chegar o Filho do Homem, a humanidade reconciliada. Este é o tempo
oportuno.
Está preparada nossa figueira para dar frutos? Em que “estação” nos encontramos?
Jesus era um profundo observador da natureza; sabia
“ler” as estações da natureza e vislumbrar, por detrás delas, a
manifestação da presença divina.
Toda estação tem seu sentido, sua riqueza e seu
mistério. Não é um mero repetir de ciclos: cada uma delas traz algo novo,
diferente. Também não estão separadas e nem há uma divisão estanque entre as
estações: estão inter-conectadas, inter-dependentes. Cada estação é mobilização
para a seguinte.
As estações da natureza nos ajudam a des-velar as
estações existenciais. Cada estação interna é um “kairós”, um
tempo único e original, que deve ser vivido intensamente. Cada estação interior
também apresenta sua riqueza e seu mistério. O problema está na petrificação de
uma estação interior, ou seja, medo da mudança, medo de entrar em outra estação,
medo de fazer a passagem.
Outro problema é o fato de não suportar uma determinada estação, querendo fugir dela para entrar logo em outra estação. Cada estação gesta algo novo; vivê-la a fundo é humanizar-se, deixar-se surpreender.
Podemos distinguir dois movimentos
nas estações existenciais: dois de maior interioridade (outono e inverno):
tempo de desfolhamento, esvaziamento e poda para livrar-se do que está sobrando
(outono). Tempo de descida (hibernação) para concentrar-se no essencial
(inverno).
Outro movimento: primavera e verão – vida expansiva,
aberta (tempo dos brotos, flores e frutos: sonhos, desejos, projetos,
criatividade).
Em todas as estações há uma certeza: a presença
da seiva (presença divina), que tudo sustenta, embora, muitas vezes tudo
parece estar morto.
Cada tempo litúrgico também apresenta
diferentes estações ao longo do ano; estamos terminando um tempo litúrgico, com
suas diferentes estações, e nos preparando para viver outro novo tempo, com
suas surpresas. Uma nova esperança reacende e a nossa vida adquire novo sabor e
sentido.
O anúncio de uma nova “estação” abre um “tempo” de
júbilo imenso porque chega o Filho do Homem, nova humanidade reconciliada, a
meta da criação de Deus, centrada e redimida em Cristo.
Estamos esperando o novo ser humano que vem de Deus,
ou seja, de nossa mesma capacidade divina de ser e de nos renovar; esperamos o
Deus de Jesus que é e que vem em nós.
Falsos sóis, luas e astros (ego inflado) querem fazer prevalecer suas efêmeras luzes em nosso interior, fazendo brilhar nossa vaidade, nossa prepotência, nosso auto-centramento. Tudo isso deve ser abalado e cair, para que o centro de nosso espaço interior seja ocupado pela presença d’Aquele “que é tudo em todos”.
Nos dias sem sol de nossa vida, a esperança se
parece a esses ramos de árvores no inverno. Dá a impressão de estarem mortas.
Mas o calor da primavera as desperta e as veste de novo vigor. Há dias nos
quais a esperança se parece a grãos semeados na terra. Ninguém mais os vê, até
que um dia somos testemunhas de que o broto surge e o talo espera a espiga.
Para o cristão, a esperança é muito mais que otimismo; é a virtude teologal que nunca engana. Esperar é a capacidade de ver, mesmo quando nossos olhos não veem. É um dom do Espírito que deve ser pedido sempre. Cristo é o motivo angular de nossa esperança, a revolução na história apesar da limitação, do mal e da morte, que nos impulsiona a “esperar contra toda esperança” (Rom. 4,18)
Texto bíblico: Mc 13,24-32
Na
oração:
“Marana
thá” (vem, Senhor! Vem, mundo melhor!), repetiam em aramaico os primeiros
cristãos para dizer e realizar a esperança. Esperar não é pedir
nem aguardar que alguém venha ou que algo aconteça. É levantar a cabeça e abrir
os olhos, levantar-nos cada dia, deixar-nos inspirar pelo Espírito que alenta
em tudo, semear e antecipar o mundo melhor, necessário e possível, como fez
Jesus. Assim é que devemos e podemos “esperar”.
-
Em que “estação” a árvore da sua vida se encontra? Primavera, verão, outono ou
inverno? Você percebe o “novo” que cada uma delas está gestando?
- A
“seiva”, que inspira e sustenta todas as “estações” de sua vida, encontra
facilidade para circular por todo o seu ser? Há alguma dimensão da sua
interioridade que está bloqueada, impedindo a passagem do “oxigênio divino”?
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