“Encontrei a minha ovelha que estava perdida”;
“encontrei a moeda que tinha perdido”; “este teu irmão estava perdido, e foi
encontrado”
As
três parábolas deste domingo, relatadas por Lucas, condensam toda a
história de nossa salvação. Elas contêm a quinta-essência do Evangelho do Reino
do Pai, proclamado por Jesus, ou seja, a história do amor de Deus para com a
humanidade.
Justamente
por serem o Evangelho condensado, as parábolas contadas por Jesus devem ser
incessantemente escutadas e contempladas por todos nós. E, depois de
contempladas e experimentadas, devemos contá-las, proclamá-las e
testemunhá-las, sempre de novo, a todos os homens e mulheres que Deus ama.
Elas
são as parábolas da nossa vida, da nossa história, de cada um dos nossos
caminhos.
Elas
são as parábolas da nossa origem e do nosso destino.
As
três parábolas da misericórdia são, na verdade, as “parábolas dos
perdidos”.
O
que Jesus quis proclamar, ao contá-las, foi revelar a nova imagem do Deus
Pai/Mãe que, movido pelo seu amor, misericórdia, perdão, sai ao encontro dos
que estão “perdidos”.
As
três parábolas expressam, com uma força insuperável, dois temas particularmente
caros a Lucas e vinculados entre si: o tema da misericórdia e do perdão
oferecidos por Deus aos pecadores, a todos os “perdidos”, e o tema da alegria
do mesmo Deus quando os perdidos são encontrados.
A trama das três parábolas é a expressão de que vivemos
permanentemente banhados pela misericórdia reconstrutora de Deus, e que se
expressa no perdão contínuo. Jesus, nestas parábolas, nos revela que Deus vai aonde
nunca antes ninguém se atrevera ir, acompanhando-nos com sua presença,
aproximando-se de nós e nos convidando à festa do seu perdão, com uma
misericórdia sem fim.
As
três parábolas também revelam o caráter de defesa, feito pelo próprio
Jesus, do seu modo de vida, do seu comportamento, particularmente do seu
relacionamento com os extraviados e excluídos. O Evangelho que Jesus proclama
com palavras e ações é a Boa Nova da salvação para os perdidos; e é, ao mesmo tempo, apelo à conversão dirigido aos que
se consideravam “justos”, mas se fechavam ao amor e ao perdão.
O
que escandalizava os destinatários das três parábolas, que se consideravam
justos e cumpridores exemplares da lei de Deus, não era propriamente a conduta
dos pecadores, mas a conduta do próprio Jesus com relação a eles: permitia que
os pecadores se aproximassem dele, recebia-os de coração aberto, tomava a
iniciativa de ir ao encontro deles e sentava-se com eles à mesma mesa.
O
comportamento de Jesus é uma “parábola viva” do comportamento de
Deus com os pecadores.
Os
escribas e fariseus não podiam suportar que Jesus proclamasse o Deus que acolhe
e perdoa incondicionalmente a todos, que tem um carinho especial e um amor de
predileção pelos perdidos; um Deus que sai ao encontro dos perdidos e que
transborda de alegria quando os encontra.
Esse
Deus “novo” anunciado por Jesus era um Deus “desconcertante”, “escandaloso”,
totalmente incompatível com o “deus legalista” dos escribas e fariseus. Por
isso, a pregação e o comportamento de Jesus eram intoleráveis para eles.
As
três parábolas nos revelam os sentimentos e as ações do “Abba de Jesus” com
relação aos filhos perdidos. Revelam-nos um Deus cheio de ternura e de
misericórdia que vai ao encontro dos perdidos, libertando-os da exclusão e do
isolamento; um Deus que exulta de alegria quando os reencontra e que convida a
todos para a festa da comunhão e da alegria pelo seu retorno.
As
três parábolas de Lucas nos permitem também fazer uma leitura em “chave
de interioridade”, ou seja, “o quê está perdido, rejeitado, escondido... dentro
de mim”?
Os
entendidos em restauração de obras de arte sabem que não se trata de voltar a
pintar de novo a obra em questão. Nem sequer refazê-la, com outras cores, o que
parece que está perdido. Um bom restaurador procura limpar com delicadeza e
paciência cada detalhe do quadro, com a única pretensão de trazer de novo à luz
o mais original da obra. Isto é o que Deus faz conosco, através de sua
misericórdia. Limpa-nos com delicadeza em cada esquina e dobra de nosso
coração. A misericórdia de Deus atua para que venha à luz o mais original que
há em nós. Somos filhos(as) de um Deus que é todo bondade e amor. Somos obras
de arte restauradas pelo amor ativo de Deus.
Viver
a experiência da misericórdia é deixar-nos reconstruir por um amor que nos
oferece a possibilidade de sentirmos novamente como filho e filhas de Deus.
Precisamos,
como Deus, tomar iniciativa, aprender a nos aproximar daquilo que está perdido
e desgarrado em nós, sem julgamentos e sem moralismos. Aproximar-nos, acolher,
abraçar, colocar nos ombros, tudo o que foi rejeitado e excluído, para
pacificar nossa interioridade.
Tudo
aquilo que consideramos “perdido” (fragilidades, feridas, traumas, fracassos,
crises...) tem algo a nos revelar. Nada pode ser rejeitado, tudo deve ser
acolhido pois tudo compõe a nossa história de vida. Precisamos fazer as pazes
com o que foi reprimido e afastado e que continua gerando um mal-estar
interior.
O diálogo com as ovelhas
desgarradas, as moedas perdidas e o filho pródigo, significa dirigir a atenção
para as áreas reprimidas de nossa condição humana e que foram excluídas porque
centramos forças em alimentar nossas imagens aureoladas e ideais exagerados,
dominados pelo desejo de sermos perfeitos e infalíveis (fariseus e mestres da
lei). Acolher e integrar tudo o que é humano (também o que está afastado dentro
de nós) é a condição para a verdadeira experiência de Deus.
O encontro com o que está perdido
em nosso interior é oportunidade para nos lançarmos por inteiros nos braços
misericordiosos de Deus. Pois Ele vem ao nosso encontro em nossas carências e
fraquezas; Ele nos procura através de nossos fracassos, de nossas feridas, de
nossas limitações... Deus serve-se do que está perdido em nós para abraçar-nos
carinhosamente.
Portanto, o caminho para a integração e
alegria interior passa pelo encontro e acolhida de tudo aquilo que foi
rejeitado, reprimido e excluído dentro de nós, consumindo muita energia.
A espiritualidade das parábolas de Lucas
nos mostra que é exatamente em nossas feridas onde Deus encontra mais
facilidade para entrar em nossas vidas e reconstruir nossa identidade
verdadeira: filhos e filhas amados(as) com um “amor em excesso”.
“Lá onde nós
fomos feridos, onde nos quebramos, aí nós também nos abrimos para Deus” (H. Nouwen)
Poderíamos nos interrogar: o que é
que Deus deseja nos revelar por meio daquilo que está “perdido” em nós? Procurar
e buscar o que está “perdido” em nossa casa interior significa “buscar e encontrar a Deus” exatamente em nossas paixões, em
nossos traumas, em nossas feridas, em nossos instintos, em nossa impotência e
fragilidade...
Viver uma nova espiritualidade significa, então, não buscar “ideais
de perfeição”, mas dialogar com a “vida perdida” e que deseja retornar
ao lar, espaço do amor misericordioso.
A partir da experiência da
misericórdia podemos reunir em nosso redil, em nossa casa, tudo o que se
afastou e se perdeu. Daqui po-derá brotar nova possibilidade de vida, mais leve
e mais humana.
Texto bíblico: Lucas
15, 1-32
Na oração:
Qual
é a ovelha desgarrada do seu interior que é preciso ir atrás dela, acolhê-la e
integrá-la ao redil? Qual é a moeda que ali se perdeu?
-
Apresente a Deus suas ovelhas e moedas perdidas, para que, na luz da sua
misericórdia, tudo adquira novo brilho e nova vida.
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