“Então Jesus levou-os para fora, até perto de
Betânia. Ali ergueu as mãos e abençoou-os. Enquanto os abençoava, afastou-se
deles e foi levado para o céu” (Lc 24,50-51)
Agora
que estamos chegando ao final do Tempo Pascal, vale a pena notar que a Páscoa, chave, centro e ponto de
partida da fé cristã, é um acontecimento de uma riqueza tal que é impossível
descrevê-lo com uma só imagem. Por isso, celebramos o mistério pascal durante
cinquenta dias, e logo prolongamos esta celebração cada domingo. Trata-se de um
acontecimento único, embora nós, para entendê-lo melhor, o celebremos por
etapas. Dito de outra maneira: Paixão, Páscoa, Ascensão e Pentecostes são a
mesma realidade. Pode-se falar de quatro momentos, mas, na realidade são
distintas perspectivas do mesmo Mistério.
Quê estamos celebrando com a Ascensão? A Ascensão é mais um aspecto
da cristologia pascal.
Cristo alcançou, na Ascensão, uma
situação e um estado de infinitude que lhe permite preencher tudo com sua
presença definitiva, e para comunicar-nos sua presença divina. Portanto, não se
trata de uma Ascensão para um lugar físico que o afastaria para longe da
humanidade.
A nuvem que o “oculta”, enquanto
subia ao céu, não está nos indicando sua “ausência”, mas uma forma distinta de
sua presença. Daqui em diante, Jesus estará presente entre nós através de seu
Espírito, cuja missão é ser memória permanente e dinâmica para que não nos
esqueçamos do que Ele disse e fez.
Precisamos
recordar que, terminada a presença histórica de Jesus, vivemos o “tempo do
Espírito”, tempo de criatividade e de crescimento responsável. O Espírito não
nos proporciona a nós, seguidores(as) de Jesus, “receitas eternas”. Mas nos dá
luz e ânimo para buscar caminhos sempre novos a fim de prolongar hoje o modo
original de ser e de atuar de Jesus. Assim Ele nos conduz para a verdade
completa de Jesus.
Lucas,
o único evangelista que fala de ascensão, termina seu relato apresentando-nos
os discípulos como que pasmados, olhando para o alto e a alguns personagens
vestidos de branco que lhes repreendem: “Homens
da Galileia, porque estás aí olhando ao céu?”
Como Jesus, a única maneira de
alcançar a plenitude da vida não é “subir”, mas é “descer” até o mais profundo
de nosso ser. Aquele que mais desceu é o que subiu mais alto.
Jesus deixou suas pegadas cravadas
na terra, mas os discípulos ficaram assombrados com o olhar fixo nas alturas. Ao
céu só se chega caminhando para as profundezas de nosso ser, pois só no mais
profundo de cada um (céu interior), podemos encontrar o divino.
Não
causa estranheza que, ao narrar a despedida de Jesus deste mundo, Lucas
descreva de forma surpreendente: Jesus ergue as mãos e “abençoa” seus discípulos. É seu último gesto. Jesus volta
ao Pai levantando as suas mãos e abençoando os seus seguidores. Ele entra no
mistério insondável de Deus e sobre o mundo faz descer sua benção. Jesus deixa
atrás de si sua benção. Os discípulos, envolvidos por sua benção, respondem ao
gesto de Jesus indo ao templo cheios de alegria. E estavam ali “bendizendo” a
Deus.
Saboreando com mais profundidade a
narrativa da Ascensão, caímos na conta da insistência de Lucas no tema do bendizer de Jesus: “levantando as mãos os abençoou e enquanto os
abençoava,
se afastou deles...”.
Ao fixar a atenção no seu
“bendizer” e fazendo uma tradução ao pé da letra do verbo grego “eu-logeo” (“eu”=
bem; “logeo”= dizer), ficamos surpresos de que Jesus sobe aos céus dizendo
coisas boas de seus discípulos e deixando um “informe final” sobre eles,
claramente positivo.
É como se, antes de partir, Jesus
tivesse redatado sua avaliação para prestar contas ao Pai e, para alívio nosso,
revela-se satisfatória e elogiosa: somos boa gente, com pontos da vida a serem
melhorados com certeza, mas, no conjunto, estamos bem. Ele leva anotadas muitas
coisas boas de nossas vidas para contá-las ao Pai.
Vamos
agora contemplar o gesto das mãos de Jesus que abençoam.
Jesus
sempre gostou de “abençoar”. Abençoou as crianças, os pobres, os doentes e desventurados.
Seu gesto era carregado de fé e de amor. Ele desejava envolver aqueles que mais
sofriam, com a compaixão, a proteção e a benção de Deus.
A
partir de então, seus(suas) seguidores(as) começam sua caminhada, animados por
aquela benção com a qual Jesus curava os doentes, perdoava os pecadores e
acariciava os pequenos.
Nós, seguidores(as) de Jesus, somos
portadores(as) e testemunhas de sua benção no mundo.
Como cristãos, esquecemo-nos que
somos canais da bênção de Jesus. A nossa primeira tarefa é ser testemunha da
Bondade de Deus. Manter viva a esperança, não nos rendermos diante de tanto
“maldizer”.
Deus olha a humanidade com ternura
e compaixão.
Já faz muito tempo que esquecemos
isso, mas a Igreja deve ser, no meio do mundo, uma fonte de benção. Num mundo
onde é tão frequente “maldizer”, condenar, prejudicar e difamar, é mais
necessária do que nunca a presença de seguidores(as) de Jesus que saibam
“abençoar”, buscar o bem, dizer bem, fazer o bem, atrair para o bem.
A
benção é uma prática enraizada em
quase todas as culturas como o melhor desejo que podemos despertar para com os
outros. O judaísmo, o islamismo e o cristianismo lhe deram sempre grande
importância. E, embora em nossos dias tenha sido reduzida a um ritual quase em
desuso, não são poucos os que ainda destacam seu conteúdo profundo e a
necessidade de recuperá-la.
Abençoar é, antes de mais nada, desejar o
bem às pessoas que encontramos em nosso caminho. Querer o bem de maneira
incondicional e sem reservas. Querer a saúde, o bem-estar, a alegria..., tudo o
que pode ajudá-las a viver com dignidade. Quanto mais desejamos o bem para
todos, mais possível é sua manifestação.
Abençoar é aprender a viver a partir de uma
atitude básica de amor à vida e às pessoas. Aquele que abençoa esvazia seu
coração de outras atitudes pouco sadias, como a agressividade, o medo, a
hostilidade ou a indiferença. Não é possível abençoar e ao mesmo tempo viver
condenando, rejeitando, odiando.
Abençoar é desejar a alguém o bem do mais profundo de
nosso ser, mesmo que nós não sejamos a fonte da benção, mas apenas suas
testemunhas e portadores. Aquele que abençoa não faz senão evocar, desejar e
pedir a presença bondosa do Criador, fonte de todo bem. Por isso, só se pode
abençoar numa atitude de agradecimento a Deus.
A benção faz bem a quem a recebe e
a quem a pratica. Quem abençoa os outros abençoa-se a si mesmo. A benção fica
ressoando em seu interior, como prece silenciosa que vai transformando seu coração,
tornando-o melhor e mais nobre. Ninguém pode sentir-se bem consigo mesmo
enquanto continua maldizendo o outro no fundo do seu ser. Não é possível ser
canal de benção do Criador se do próprio coração brotam palavras de intolerância,
de preconceito e julgamento. “Maldizer” o outro é maldizer-se a si mesmo.
Texto bíblico: Lc
24,46-53
Na oração:
Fazer
memória dos momentos em que você foi canal de benção para muitas pessoas.
-
Você usa as redes sociais para “bendizer” ou “maldizer”?
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