“Não vos preocupeis com a vossa vida, com o que haverei de comer ou
beber; nem com o vosso corpo, com o que havereis de vestir” (Mateus 6,25).
Jesus se dirige aos seus discípulos e revela o
verdadeiro rosto de Deus e as suas
entranhas de Pai-Mãe, que cuida dos
próprios filhos, como também das flores do campo e dos pássaros do céu. O
fundamento da segurança e da serenidade reside na consciência de estar nas mãos
providentes de Deus.
O ser humano conhece bem a própria condição de
precariedade e as muitas situações adversas que podem tornar o seu futuro
incerto. A inevitável experiência da limitação tira as forças e dificulta
o caminho.
Surgem, então, a preocupação e a ansiedade
que tornam o seu rosto cansado e triste e, até mesmo apagar em seu coração a
alegria de viver.
Por isso, o ser humano, instintivamente,
busca algo ou alguém que lhe dê segurança, e sente a necessidade inapagável de
superar a angústia do limite e de respirar futuro.
Sem futuro não há espaço de vida, não há esperança. Mas nada o preenche e o
pacifica interiormente. A consequência é um rosto marcado pelas rugas da
preocupação e do cansaço. A confiança depositada no bem-estar, a rejeição das
próprias raízes, a incapacidade de sentir-se “filho”, obscurecem a horizonte do
futuro.
A “pre-ocupação”,
quando se torna hábito de vida, tem o efeito desastroso de comprometer a
capacidade de relação, dimensão fundamental que torna a existência fecunda e
criativa. Segundo o Evangelho, a preocupação
envolve duas necessidades básicas do ser humano: o alimento e o vestuário.
a) O alimento, indispensável para viver, não
compreende só a nutrição, mas representa também tudo aquilo que é considerado
necessário para manter a pessoa viva.
b) O vestuário não é somente aquilo que
cobre e protege o corpo humano, mas exprime também proteção, dignidade, posição
social e relação.
O alimento
e o vestuário, portanto, representam
duas dimensões essenciais da existência humana: uma individual e outra
relacional.
A preocupação
que pode atormentar o coração do ser humano, o medo de perder aquilo que dá segurança e o temor de não ter acumulado suficientemente, fazem com que o
alimento e o vestuário percam o seu significado mais amplo e a sua força
evocativa.
Então, acontece que a preocupação com o alimento e com o vestuário prevalece sobre a própria vida, não mais acolhida como
dom; do mesmo modo o corpo, não mais entendido como possibilidade e lugar de
relação-encontro. Inevitavelmente, a dignidade da vida se degrada e a luz do
rosto da pessoa se apaga.
Muitas
vezes, a preocupação com o amanhã oculta a beleza do presente, mas também a
lembrança de um passado que reaparece sempre de novo entorpece esta vivência.
As pessoas
espiritualmente inteligentes vivem serenamente com a máxima intensidade o
agora, cada momento que se apresenta na vida, sem a pre-ocupação e a ansiedade
frente o futuro. Sabem que tudo passa, mas que cada instante é uma porta de
acesso à eternidade. Gozam intensamente da alegria de existir, da beleza e da
bondade que se manifestam em cada momento. Não sofrem pelo passar do tempo, nem
pelo envelhecimento ou pela morte. Usufruem intensamente o tempo presente e
encontram nisso sua alegria.
Este sentimento não é
um estado de espírito suscitado por um objeto de consumo, nem por um êxito
pontual ou por um reconhecimento público. Ele emerge das profundezas, do fato
de estar existindo e da capacidade de vibrar com a beleza que existe nas
coisas.
Esta
vivência plena do momento não entra em contradição com o fazer da vida um
projeto pessoal. Dar sentido à vida é fazer dela uma missão que tenha como objetivo
um fim nobre, algo que mereça a entrega e o sacrifício; mas isso não significa
transformar o presente em puro instrumento e pretexto do futuro.
Quem vive com
entusiasmo seu projeto vital, quem ama seu trabalho, sua missão, quem se
entrega apaixonadamente ao compromisso que desenvolve no mundo, experimenta a
alegria de existir independentemente do fato de seu projeto, a longo prazo,
chegar ou não ao seu cumprimento.
Quando alguém está
centrado no presente, envolvido criativamente em algo que o satisfaz de
verdade, que vive cada instante com a máxima intensidade e não se preocupa com
os resultados ou benefícios..., esse é capaz de dar-se conta de que cada dia é
uma possibilidade, cada dia é um dom único e irrepetível.
Quando uma pessoa
vive a presença plena do agora não sofre com o que virá, nem mesmo com a
certeza da morte, consciente de que quando chegar a esse dia poderá confessar
que viveu, que experimentou seu ser aqui.
Por outro lado, aquele
que passa mecanicamente de um momento a outro, esperando um futuro supostamente
feliz, vive angustiado e cheio de temor. Não tem nenhuma garantia de chegar a
tal futuro e esse estar dependente do amanhã o transforma em escravo.
A dimensão espiritual
habilita a experimentar a alegria de existir, transcendendo a mania de esperar
e a obsessão de recordar. Esta alegria é a que Jesus vê refletida nos lírios do
campo e nas aves do céu.
Ao observar as aves do céu e a beleza dos lírios no
campo, Jesus convida os discípulos a contemplarem, com admiração, o rosto paterno-materno de Deus: cada um
deles é cuidado pela Sua mão providente.
Não se trata de se colocar numa atitude de espera passiva, mas de estar
ciente de que Alguém cuida, não só das menores criaturas, mas também da vida
dos próprios filhos, como um tesouro do qual tem ciúmes.
Deus não descuida de nenhuma das suas criaturas, nem mesmo as mais
frágeis – os lírios - ou as mais imprevisíveis – as aves. Ele tece, com
incrível precisão, a forma, a cor e o perfume da flor, que desabrocha pela
manhã e à noite, murcha, é jogada ao fogo. Ele cuida dos filhotes dos pássaros,
que não tem condições de semear e de colher, e nem de acumular; muito mais faz
Deus pelo ser humano, criatura predileta por quem demonstra tanto afeto e
carinho.
Tomando
como exemplo os pássaros do céu e os
lírios do campo, Jesus,
implicitamente, une o céu e a terra, e recorda que o ser humano é
formado do “húmus” e do “sopro” de Deus.
O fiel
discípulo de Jesus, descobrindo-se amado e protegido com a ternura providente,
se sente sempre a caminho, isto é, pronto a acolher cada fragmento de luz e de
vida, que fala da presença e da passagem do Pai. O presente, tecido de
partilha, solidariedade, doação, misericórdia, mansidão, reveste o futuro de
luz.
A
verdadeira segurança cresce no coração e na confiança de sermos protegidos por
um Deus que sabe o que precisamos e nos aguarda. A busca do Reino é o “pão” da vida e a “roupa” da luz que nos
envolve.
Texto bíblico: Mateus 6,24-34
Na oração:
Quê oportunidades você percebe no
dia de hoje? Ou nesta semana?
Você tem consciência das surpreendentes oportunidades que Deus oferece cada
dia? Conversações, leituras, vivências, sentimentos, gestos, orações...
Viva cada jornada como um mistério,
uma festa, uma página em branco que você pode escrever de muitas formas
diferentes. Cada dia é um cenário onde você pode ativar o amor, a justiça e a
fé. Sempre.
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