“Trazei depressa a melhor
túnica para vestir meu filho. Colocai-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés.
Trazei um novilho gordo e matai-o, para comermos e festejarmos” (Lucas 15,22-23 )
Tornar presente o Pai como Amor e Misericórdia foi, para Jesus, o cerne de sua missão: toda
a sua vida foi uma eloquente revelação da misericórdia
divina para com a humanidade.
Jesus,
presença visível da misericórdia, revela um Deus Pai-Mãe, cheio de ternura e de
misericórdia que vai ao encontro dos perdidos, libertando-os da exclusão e do
isolamento; um Deus que exulta de alegria quando os reencontra e que convida a
todos para a festa da comunhão e do perdão.
Essa é a
descrição de Deus cuja bondade, generosidade, amor, alegria e compaixão não tem
limites.
Um Deus
novo, “desconcertante”, “escandaloso”,
totalmente incompatível com o “deus legalista” dos escribas e fariseus. A Misericórdia de Deus por nós faz-lhe
perder sua soberania e compostura e sair correndo ao nosso encontro, para abraçar-nos na nossa humanidade ferida e
profanada, para devolver-nos a filiação
e a dignidade.
“Onde há misericórdia, aí está presente o Espírito de Deus. Onde há rigidez,
aí estão seus minis-tros” (Papa Francisco).
O que escandalizava os destinatários das parábolas
da Misericórdia (Lc 15) contadas por Jesus, que se consideravam justos e cumpridores
exemplares da Lei, não era propriamente a conduta dos pecadores, mas a conduta
do próprio Jesus com relação a eles; Ele, rosto visível da misericórdia,
permite que os pecadores se aproximem dele, recebe-os de coração aberto, toma a
iniciativa de ir ao encontro deles e senta-se com eles à mesma mesa.
O comportamento
de Jesus é uma “parábola viva” do comportamento de Deus com os pecadores.
Na parábola de hoje, o pai aparece sempre como
alguém que contraria as expectativas dos ouvintes, que vai contra a visão de
Deus daquele que está habituado à lei do “olho por olho, dente por dente”.
Os escribas e fariseus não podiam suportar que
Jesus proclamasse que Deus acolhe e perdoa incondicionalmente a todos, que tem
um carinho especial, um amor de predileção pelos perdidos; um Deus que vai ao
encontro dos perdidos e que transborda de alegria quando os encontra.
A parábola do Pai Misericordioso condensa toda a história de nossa salvação. Ela
contém a quinta-essência do Evangelho do Reino do Pai proclamado por Jesus, a
história do amor de Deus para com a humanidade. O que Jesus quis proclamar ao
contá-la foi que o amor, a misericórdia, o perdão e a comunhão são oferecidas
por Deus aos “perdidos”.
Justamente por ser o Evangelho condensado, esta
parábola deve ser incessantemente ouvida e contemplada por todos nós. E depois
de contemplada e experimentada, devemos contá-la, proclamá-la e testemunhá-la,
sempre de novo, a todos os homens e mulheres que Deus ama.
Ela é a parábola da nossa vida, da nossa
história, de cada um dos nossos caminhos.
Ela é, enfim, a parábola da nossa origem e do
nosso destino.
Longe de uma imagem de um Deus severo, com a lei
na mão pronto para nos acusar, Jesus nos revela o rosto de Deus Pai-Mãe de
infinita ternura, que se alegra com o retorno de seus filhos à convivência em
sua casa. De fato, no Evangelho de hoje, a volta do filho perdido provoca uma “explosão
de alegria” no Pai. Sua alegria
era tão intensa que ele não poderia esperar para dar início à comemoração.
A expressão “depressa”
com a qual o pai exorta seus criados denota que o serviço deve ser executado
sem demora, pois o filho não pode ficar por mais tempo privado de sua dignidade.
As ordens
aos empregados são dadas em voz alta para que todos fiquem sabendo da festa, para que a sua alegria seja
conhecida e partilhada por todos.
Ele convida todos
a comer, beber e dançar. Uma grande festa
tem início, mas não tem fim.
Tão fortemente o pai deseja
dar vida a seu filho mais novo que parece quase impaciente. Nada é
suficien-temente bom. O melhor precisa lhe ser dado.
Ele ordena que o filho seja imediatamente
vestido com a túnica luxuosa, como a
que é usada nos dias de festa pelos hóspedes ilustres. O filho recupera sua identidade
e sua dignidade de filho. O pai lhe dá o anel para honrá-lo como seu filho amado e novamente devolver-lhe a
condição de herdeiro e a plenitude de seus direitos. Com as sandálias, é devolvida ao filho a
condição do homem livre e de senhor da casa.
Mas o Pai não ama só o filho perdido e
reencontrado. Ele ama também aquele que ficou em casa, a seu lado, e que deixou
seu coração endurecer. Ele vai ao seu encontro, vai para pedir que participe da
alegria
do reencontro e da festa. Não o
deixa na sua solidão e na sua rejeição. Não acusa seu pecado.
O Pai vai procurar também aqueles
que tem um coração de pedra, invejosos e legalistas. O fato miraculoso não está
só em que o pai não renegou o filho mais moço, e sim que tenha sido
compreensivo com um homem tão duro, frio e rígido como o filho mais velho, e
que continua a chamá-lo de “filho”.
O “princípio
misericórdia”, portanto, é o núcleo do Evangelho. E a misericórdia é o “amor
em excesso”. Na misericórdia, Deus sempre nos
surpreende, sempre excede nossas estreitas expectativas, para abrir caminho a
partir de nossas fragilidades. Só o amor misericordioso de Deus nos
reconstrói por dentro, destravando-nos, colocando-nos em movimento e
abrindo-nos em direção a um horizonte de sentido, de responsabilidade e compromisso.
Deus não só
tem um coração que ama. Isso já é
extraordinário.
Mas também
tem entranhas, uma ternura que se
comove. Isso é avassalador.
A misericórdia constitui a resposta de
Deus à indigência do ser humano: ela re-cria a vida, pois, a força
criativa da sua misericórdia põe em movimento os grandes dinamismos de nossa vida; debaixo do modo paralisado e petrificado
de viver, existe uma possibilidade de vida
nova nunca ativada.
Deus,
em sua misericórdia reconstrutora,
libera em nós as melhores possibilidades, riquezas escondidas,
capacidades, intuições... e nos faz descobrir em nós, nossa verdade mais profunda de pessoas
amadas, únicas, sagradas, responsáveis...
A misericórdia é expansiva, ela abre um
novo futuro e desata ricas possibilidades latentes em cada um. Ela não se
limita ao êrro, mas impulsiona cada um a ir além de si mesmo.
Onde não
há misericórdia, não há sequer
esperança para o ser humano.
Podemos concluir afirmando que a misericórdia não é só a mais divina mas
também a mais humana das virtudes. É aquela que melhor revela a natureza do
Deus Pai e Mãe de infinita bondade. É a que revela igualmente o lado mais luminoso
da natureza humana; nesse sentido, a misericórdia é a que mais humaniza as
relações entre as pessoas.
Por isso, Jesus
propõe um modo de ser humano
inseparável da misericórdia do Pai: “Sede misericordiosos como o Pai é misericordioso” (Lc. 6,36)
Ser misericordioso “como” Deus constitui o mais elevado convite e a mensagem mais
profunda que o ser humano recebe sobre como tratar a si mesmo e aos outros.
Texto bíblico: Lucas 15,1-3.11-32
Na oração: A experiência de misericórdia ativa em nós um modo de viver misericordioso.
O Deus de misericórdia cria em nós um coração
novo, feito de acordo com o Seu, capaz de misericórdia.
Entrar no
“fluxo” da misericórdia divina: ser canal por onde circula o amor
misericordioso de Deus em favor dos outros.
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