Apresentamos a seguir o texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj (Centro de Espiritualidade Inaciana - CEI), como sugestão para rezar o Evangelho indicado para a Quinta-feira da Semana Santa, dia da instituição da Eucaristia. O texto é um subsídio para se preparar e vivenciar mais intensamente este grande mistério.
“Tomai
e comei, isto é meu Corpo; tomai e bebei, isto é meu Sangue”
Os
integrantes do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC)
estabeleceram para este ano de 2016 mais uma Campanha da Fraternidade Ecumênica
com o tema: “Casa comum, nossa responsabilidade”. Todos os cristãos, em
suas diferentes denominações, devem assumir o desafio de construir uma Casa
Comum justa, sustentável e habitável para todos os seres vivos.
Este
compromisso é profético, pois questiona e denuncia as estruturas que provocam
diferentes tipos de exclusão: econômica, ambiental, social, racial e étnica.
Tudo isso rompe a comunhão com o cosmos, fere e fragiliza a dignidade de homens
e mulheres.
Nesta
5ª. feira Santa, dia da instituição da Eucaristia, podemos buscar, nesta
última refeição de Jesus, a inspiração e o sentido para uma consciência
ecológica integral, restabelecendo a comunhão universal com todas as expressões
de vida.
Conhecemos
o quadro da Última Ceia
de Salvador Dali: o
Cenáculo alto, Jesus e os discípulos, o pão partido, o vinho vermelho translúcido...
O autor fez as paredes do Cenáculo,
enormes, de vidro, como nunca foram na realidade. E, da singeleza da
Eucaristia, o olhar vai mergulhando para fora, vendo o mar, as praias, as
montanhas, o mundo, o universo... tudo isto transfigurado
por um abraço de um corpo humano/divino enorme, braços abertos, acolhendo a
cena toda... É como se Ele ficasse
transparente e a gente passasse a ver o mundo inteiro através d’Ele.
Um
sintoma típico da pós-modernidade é o sentimento de orfandade: o universo
já não é mais entranha que gera vida, mas um deserto. Percebemos que temos
perdido o contato e a comunhão com o cosmos, com o chão, com os
animais, com as aves, com os rios e oceanos... e isto tem provocado em nós toda
espécie de mal-estar, de doenças, de insegurança, de ansiedade. Somos “seres
urbanóides”, cercados de cimento e asfalto por todos os lados. Quando
perdemos o contato com a natureza e nos distanciamos da terra, nos tornamos insensíveis,
frios e incapazes de compaixão e cuidado.
A Última Ceia de
Jesus com os apóstolos revela que a Criação é obra de Deus e exige uma
aproximação contemplativa. Quanto mais proximidade e intimidade com a terra,
mais profunda é a comunhão com todos os seres. A Terra nos encanta e nos
convida, continuamente, à admiração, ao cuidado e à veneração.
Estamos mergulhados no “grande
Templo” formado por uma multiplicidade de notas, sons, sinais e mensagens
diferentes. Formamos uma realidade complexa, diversa e única. Uma pedra, uma
cascata, uma nuvem caprichosa, um pássaro, convertem-se em veículos de
sabedoria. É necessário que nos eduquemos para captar a mensagem que eles nos
transmitem e aprender a viver a comunhão com tudo o que nos rodeia. Todo o Cosmos
é como um grande livro que precisa ser lido.
Quando o ser humano não
percebe o seu parentesco com a Criação, vive numa casa-prisão cujas paredes lhe
impedem uma comunhão cósmica. Ao contrário, quando sente a presença de Deus em
todas as coisas e entra em comunhão com toda a natureza, seu coração se
emancipa e se dilata, sua mente se abre, seus horizontes se ampliam... O
Universo passa a ser o seu grande lar, onde ele encontra o coração de Deus.
Em tudo se pode vislumbrar um lampejo da divindade. Com isso, a eucaristia
revela seu caráter universal que nos permite viver uma espiritualidade
ecológica e nos ensina a abraçar a Criação e a nos encontrar com o Deus do
Universo. A comunhão com o Universo é ponto de partida e de chegada da
Eucaristia.
O dom eucarístico,
portanto, não pode ser reduzido a um simples rito desligado das demais relações
envolventes (com Deus, com os outros e com toda a Criação).
Pela Eucaristia Deus
abraça todas as suas criaturas e as envolve no mistério pascal de seu Filho
Jesus, de modo que, de Eucaristia em Eucaristia, todo o Cosmos vai sendo
“cristificado”.
A partir da Eucaristia
tudo é sagrado, tudo é uma grande liturgia cósmica. O
universo é um grande sacramento e se transforma no espaço e no lugar de
manifestação da divindade. Tudo é sagrado; a Natureza é sagrada,
porque é Templo de Deus. Todos os lugares da mãe-Terra pelos quais caminhamos
são “territórios sagrados”. Segundo a Bíblia, a Terra é um jardim onde
Deus tem prazer em passear.
O Universo inteiro é um imenso altar
cósmico sobre o qual celebra-se, diariamente, a liturgia da vida; ao mesmo
tempo, ele é o lugar no qual podemos contemplar e acolher a presença do
Criador, a harmonia dos seres, a comunhão das criaturas. Sobre o altar do mundo
se entrelaçam o céu e a terra, de modo que toda a Criação é iluminada pela
Eucaristia.
Todas as criaturas celebram a
grande festa, ao redor da Mesa cósmica (Última Ceia – Ceia universal).
A vivência da Última
Ceia nos proporciona uma fecunda experiência cósmico-ecológica.
Em
Jesus, Deus se revelou encarnado na história e fez do
Universo seu corpo. A presença real
de Jesus, no pão e vinho da Eucaristia, nos desperta a reconhecê-Lo presente no
coração do Cosmos e da História.
No
partir do Pão e no beber do Vinho
da Eucaristia, palpita a vida
que transcende as fronteiras da morte.
Quem
come deste Pão e bebe deste Vinho, compromete-se com a luta contra as forças da
morte: egoísmo, violência, indiferença, omissão política,
desonestidade na gerência dos bens, descuido
nas relações afetivas, isolamento no medo, destruição do meio-ambiente,
poluição...
Simbolicamente, na Eucaristia,
o pão é partido para significar a
doação de Jesus; e ao comermos deste pão, aceitamos ser como o grão de trigo
que, caído no chão da história, recebe as energias que vem das profundezas da
terra e das alturas do céu.
Num
pedaço de pão há o vento que balança as espigas, a noite calma
que caiu sobre o campo, o sol ardente que faz germinar e crescer o trigo, a
água generosa que possibilitou a vida, a terra que teve de ser arada, o ser
humano trabalhando sem parar, a semente que teve de morrer para que viesse a
planta, o adubo que foi posto com mãos calosas, o gesto da mão que preparou a
massa... A natureza inteira se mobilizou para gerar o pão, que deve ser partido
e oferecido com generosidade.
Da
mesma forma, toda a Criação foi mobilizada para proporcionar o vinho da alegria e da festa.
Diante de nós, sobre o altar, está contido todo o Universo, pronto a se fazer dom e
alimento.
Jesus,
na Última Ceia, ao tomar o pão e o vinho em suas mãos, acolhe os dons da
Natureza para transmitir sua Vida a toda humanidade; Vida em abundância; Vida que não
tem fim...; a Vida num pedaço de pão e num cálice de vinho.
Texto bíblico: l Cor 11,23-35; Jo 13,1-15
Na
oração: Rezar a importância e o sentido da Eucaristia em sua
vida: obrigação? Lei? Tradição familiar?
- Quê ressonâncias tem a Eucaristia em sua vida
cotidiana?
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