“Eu vos dou um novo mandamento:
amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns
aos outros” (João 13,34).
Jesus transitou o caminho do amor.
Poucas experiências na vida proporcionam tanta
felicidade como o amar e sentir-se amado.
E é isso que os Evangelhos mais ressaltam na
pessoa de Jesus: sua extraordinária capacidade para amar, para dar e receber
amor. Jesus experimentou o amor em todas as dimensões: o amor que se faz serviço,
o amor de amizade, o amor oblativo, o amor operativo que oferece saúde, perdão,
liberdade, reconhecimento... Em definitiva, o prazer profundo de “passar pela vida fazendo o bem”.
Todas as pessoas cabiam em seu
coração, mas de um modo especial os últimos, os pequenos, os pobres, os
excluídos, os simples a quem o Pai lhes revela os segredos do Reino; tudo isso
fazia Jesus vibrar intensamente. Ele fez do amor o único necessário, a razão de sua vida e entrega e, por isso,
pode pregar com autoridade revelando que ganhamos ou a perdemos a vida em
função de que tenhamos ou não amado.
Frente às inumeráveis leis e normas da religião
judaica as palavras de Jesus soam taxativas: “Eu
vos dou um nome mandamento”. Não há outro. A
admirável simplicidade e a insistência na prática, que caracterizam a mensagem
de Jesus, se revelam também nesta síntese daquilo que deve ser o modo de
proceder dos seus discípulos. O Amor
gratuito é a verdadeira identidade do (a) seguidor(a) de Jesus.
Antes de revelar o novo mandamento, antes mesmo de
pedir aos discípulos que vivessem desse amor, Jesus foi pura vivência e
transparência do Amor descendente de Deus: “como
eu vos tenho amado”.
O texto fala de “mandamento
novo”, provavelmente um diferencial que os próprios discípulos
perceberam como “novidade” no modo de viver do Mestre, na gratuidade e incondicionalidade
de seu amor: “amor ágape”, oblativo, radical, despojado de interesses...
Amar é a única maneira de ser plenamente humano. Jesus
viveu até o limite a capacidade de amar, até amar como Deus ama. E é essa qualidade de amor o sinal
decisivo pela qual os discípulos de Jesus deveriam ser reconhecidos.
Desse modo, o mandamento do Amor
remete à Fonte que o possibilita, ao Amor originante que nos faz transcender as
rígidas fronteiras do ego e acessarmos a um nível transpessoal de comunhão,
onde o Amor poderá fluir com mais liberdade.
Tudo se enraíza no Amor do Pai que se manifestou em Jesus e que agora circulará
através dos discípulos. Trata-se do mesmo e único Amor; o que é pedido aos
discípulos é que permitam que esse Amor primeiro e originante se expresse e
seja vivido através deles e entre eles. O sentido de nossa existência,
portanto, está na experiência de entrada no fluxo do Amor fontal do Pai.
Por isso, não é um mandato vindo de
fora, como uma imposição arbitrária. Os mandamentos não são, na sua origem, um
conjunto de normas “externas” que Deus impõe ao ser humano para complicar-lhe a
vida. Neles, Deus está expressando sua forma de entender a existência, seus
sonhos sobre o mundo e sua sensibilidade diante de seus filhos e filhas. Em
outras palavras, os mandamentos “emanam” do coração misericordioso
do Pai para o bem viver da humanidade.
Nesse sentido, o “novo
mandamento”, vivido e proclamado por Jesus, é um convite a viver o que
somos, conectados com o Mistério amoroso que tudo anima e sustenta. O amor que
Jesus nos pede deve surgir de dentro, não impor-se de fora como se fosse uma
obrigação. Todos nós, criados à imagem e semelhança do Deus Amor, carregamos a
“faísca do amor”, que deve ser ativada na relação com os outros e com o próprio
Deus. Na medida em que vamos conhecendo e vivendo o que somos (nossa essência),
o amor vai abrindo caminho e nós
vamos nos parecendo mais com o Deus que é Amor.
Quando escutamos o verdadeiro Deus desperta-se em
nós uma atração para o amor. Não é propriamente uma ordem. É o que brota em nós
ao abrir-nos ao Mistério último da vida: “Amarás”.
Nesta experiência não há intermediários religiosos,
não há teólogos nem moralistas. Não necessitamos que ninguém no-lo diga a
partir de fora. Sabemos e sentimos que a essência da vida é amar.
A originalidade da afirmação
central do evangelho de hoje é a de instituir um amor horizontal em que o movimento do eu em direção ao outro é
prolongamento e imitação do movimento do amor de Jesus em direção ao ser
humano.
O mandamento bíblico do amor é,
portanto, a “inversão
da direção natural de vida do ser humano”, ou seja, “do eu em direção ao
eu”; falamos, aqui, do amor como “êxodo” do eu em direção ao outro.
Trata-se do amor de alteridade que nos descentra, nos faz sair do “nosso próprio amor, querer e
interesse” (S. Inácio).
É na presença do outro que o eu é
libertado e gerado para a nova identidade de ser responsável, ou seja, aquele
que responde e não pode deixar de responder diante de quem lhe passa ao lado.
Por isso, a nova comunidade dos
seguidores de Jesus não se caracterizará por doutrinas, nem ritos, nem normas
morais. O único distintivo deve ser o amor
manifestado em todas e cada uma de nossas ações.
Jesus não quer templos para manifestar
esplendorosas adorações, nem estruturas ou ritos que chamem a atenção, nem
poder ostentoso, nem doutrinas distantes da vida, mas a simplicidade do Amor despojado que a todos humaniza.
O Amor é
o que há de mais divino em nós; não teria sentido se o que há de mais divino no
ser humano desaparecesse. Por isso afirmava Dostoievski: “A imortalidade me é necessária, porque Deus não
cometerá
a injustiça de apagar por completo a
chama de amor por Ele que prendeu em meu coração. E o que é mais precioso que o
amor? O amor é mais excelso que a existência, o amor é a coroa da existência”.
O ser humano não tem capacidade de dar conteúdo
ao amor, de dar-lhe significado. Não pode ser inventado por ele. Recebe-o
inteiramente de Deus.
O mandamento do amor não é lei que se impõe a
partir de fora; ele “emana” do nosso próprio interior, pois o Amor “emana” do
coração de Deus. O
único que dá qualidade à vida é o amor.
É o amor que está no início da
vida, o que a origina, a sustenta, a faz crescer, a faz perdurar, lhe dá
asas... Só o amor desnudo tem o dom da eternidade. No céu, o ser humano não
necessitará da fé nem da esperança, mas sim do amor, que será seu conteúdo, sua
razão de ser. Só terá lugar o amor que habita em nós; o resto sobrará ou
desaparecerá.
“Há uma força extremamente
poderosa para a qual, até agora, a ciência não encontrou uma explicação formal.
É uma força que inclui e governa todas as outras, e que inclusive está por
detrás de qualquer fenômeno que atua no universo e ainda não fora identificado
por nós. Esta força é o Amor” (A. Einstein,
físico)
Texto
bíblico: João
13,33-35
Na oração: O Amor originante e fontal de Deus lhe envolve permanentemente; marcado
pela gratidão, queira entrar em
sintonia, “ajustar-se” ao modo de amar de Deus: amor descendente, amor sem
fronteiras, oblativo, expansivo... e que se “revela mais em obras do que em palavras”.
Movido pelo
Amor transbordante de Deus, entre no
fluxo desse Amor criativo, “descendo” à realidade cotidiana e ali deixando
transparecer esse mesmo Amor através de suas obras.
- Faça
“memória agradecida” de sua presença amorosa na realidade cotidiana. Viva em
contínua ação de graças.
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