Na reunião do dia 02/12/2013 nossa oração foi baseado no Viver em “estado de Advento”.
O texto nos lembra a importância de estarmos atentos em todos os momentos da nossa vida, até nas atividades cotidianas, pois aqueles que têm fé e esperança no Senhor que vem deve cuidar para não construir sobre a areia e para que não falte o óleo para manter a lâmpada acesa.
“Vigiai,
porque não sabeis em que dia vem o vosso Senhor” (Mt 24,42)
Advento
de novo? Um Advento a mais ou nova oportunidade? Sim, mais uma vez estamos
começando o tempo litúrgico do Advento. O risco é vivê-lo como “mera repetição”,
como um “tempo parecido” com o tempo anterior.
Na
realidade, cada Advento, por mais parecido que seja ao anterior, é totalmente
diferente; ele é original e único,
porque as esperanças são novas, os projetos são novos, a vida se renova sempre,
o seguimento de Jesus Cristo se aprofunda sempre mais...
Não
esqueçamos que o Advento é toda uma possibilidade de vida que temos à frente.
Por isso o grande grito deste primeiro domingo é “Vigiai” porque “não sabeis
quando virá o vosso Senhor”.
Ninguém
vigia o passado que já passou e já não existe mais. Vigiamos o que está por
vir, o que está vindo. A vigilância olha sempre o futuro. Um futuro que depende
de Deus e depende de nós. Porque uma coisa é a ação de Deus em cada um de nós
neste tempo do Advento e outra coisa é o que nós fazemos para que algo novo
aconteça.
Nós
mesmos somos um “advento”, porque nosso futuro humano depende do que esperamos.
Haverá
aqueles que já não esperam nada. Haverá outros que esperam algo novo, mas
duvidam. E haverá aqueles que esperam o novo e dedicam sua vida a criá-lo já
agora.
Porque
em cada momento definimos nossas vidas; em cada momento algo surpreendente pode
acontecer em nossa vida; em cada momento nossa vida pode apagar-se ou pode
rejuvenescer-se.
No
evangelho desse primeiro domingo do Advento, as duas pequenas parábolas insistem na atitude da
vigilância.
A
primeira delas nos adverte com uma intencionalidade clara: o maior inimigo da
vigilância é a dispersão, revestida de rotina e apego ao costumeiro (“comer,
beber, casar-se”). Viver vigilantes para olhar mais além de nossos pequenos
interesses e preocupações.
Na
segunda, a insistência se situa na importância de “estar vigilante”, porque o
que está em jogo é nada menos que a segurança da “casa”, ou seja, a
consistência da própria pessoa.
Tanto
nos sonhos, como nos contos e nas parábolas, a casa é um símbolo arquetípico da
pessoa. A partir desta perspectiva, a mensagem de Jesus é um chamado a tomar
consciência de quem somos, favorecendo a atitude que nos permite
“construir-nos” – a vigilância – e estando atentos àquela outra que nos “rompe”
ou arruína – a dispersão.
Podemos
compreender melhor o que ambas atitudes indicam quando as relacionamos com a
atenção, entendida como a capacidade de viver no momento presente.
A
dispersão é o estado habitual de quem se encontra identificado com seus
pensamentos, sentimentos, emoções ou reações, ignorando sua verdadeira
identidade.
A
vigilância, pelo contrário, refere-se à capacidade de não perder-se no
emaranhado dos pensamentos nem cair na armadilha das solicitações externas.
Requer, portanto, a atitude própria do sentinela: situado estrategicamente em
lugares altos e de amplos horizontes, ele recebe a delicada missão de observar,
discernir e anunciar, para defender a vida do povo
Tal
missão implica numa vigilância investigadora do horizonte, onde se fazem
perceptíveis os “sinais”, ou até mesmo os indícios de que algo importante para
a vida do povo está prestes a acontecer.
Por
isso, o sentinela está treinado para “olhar”
a grandes distâncias, para “olhar”
com precisão.
Seu
“olhar” investigador, aguçado pelo amor ao povo e a fidelidade à missão, está
em alerta permanente.
Graças
a essa distância e observação, vamos descobrindo em nós e em nossa realidade
sinais de uma Presença que vem, que está vindo... em nossa direção.
De
fato, onde colocamos nossa atenção, aí estará nossa vida (ou nossa falta de
vida). A maneira como focamos nossa atenção é fonte de equilíbrio ou de
desequilíbrio, de harmonia ou de desarmonia...
Viver
em vigilância contínua é estar em atitude de exploração e rastreamento, é nos
deixarmos ser surpreendidos, conduzidos, desafiados e, em última instância,
transformados pelo Espírito de Deus.
Precisamente
a vigilância é rastrear, descobrir os “espíritos-sopros-inspirações” do
Espírito no ritmo da vida cotidiana e em meio á realidade que nos cerca.
Rastrear-descobrir-deixar-se
conduzir: este é o movimento do tempo do Advento.
Vivemos
num contexto marcado pela “dispersão”, seduzidos por estímulos ambientais,
envolvidos por apelos vindos de fora, cativado pela mídia, pelas inovações
rápidas, magnetizado por ofertas alucinantes...
E
então, nós nos esvaziamos, nos diluímos, perdemos a interioridade e... Nos
desumanizamos.
A
pessoa “dispersa”, por não ter um horizonte de sentido que a atraia, fixa-se no
cenário externo, agarra-se ao mundo circundante, apega-se às coisas, na ilusão
de alcançar uma segurança almejada. Ela foge de si mesma, tem medo de
encontrar-se. Por isso, acompanha o ritmo dos outros, repete a linguagem dos
outros, adota os critérios dos outros, e acaba sendo influenciada e dominada
por pressões e hábitos externos.
A
“dispersão” corrói a interioridade da pessoa e dissolve aquilo que é mais nobre
em seu interior. Longe de uma humanidade dinâmica, operante, ousada... o que a
pessoa deixa transparecer é uma humanidade neutra, apática, estagnada; é
humanidade lenta, afogada na “normose”, estacionada na repetição dos gestos e
dos passos. Ela gira em torno de si mesma e não consegue fazer um salto
libertador. Isso tudo leva a pessoa a debilitar-se, provocando a redução da
vitalidade humana em vez de favorecer o crescimento pessoal.
“Dispersão”
quer dizer estar espalhado, estar ocupado em muitas coisas e em diversas
direções ao mesmo tempo, estar ausente, esquecido, dividido, distante, apenas
por cima das coisas.
Pessoa
“dispersa” é massa anônima empurrada pela multidão, vive na superfície de si
mesma, desconectada da fonte interior, desarticulada e ocupada com o que não é
essencial.
Advento
é tempo propício – “kairós” - para
ajudar a superar nossa “dispersão”
e poder recuperar a densidade
humana interna. Para isso, precisamos entrar em “estado de vigilância”,
repensar a interioridade perdida, reconquistar a autodeterminação.
E
“vigiar” não é repetir-se, mas re-descobrir-se, re-inventar-se, re-encontrar-se,
buscar-se de novo.
“Vigiar”
é re-ajuntar as energias humanas que haviam sido dispersas e canalizá-las para
reabrir horizontes fechados e gerar
diferenças originais fecundas.
“Vigiar”
é acordar a autonomia adormecida e emancipar-se, ser pólo de afirmação pessoal
e social. É indispensável colocar “ordem” por dentro e descobrir que a pessoa
pode inventar-se a cada dia, a cada passo, conduzindo conscientemente a vida em
direção à plenitude e não arrastá-la pelo chão.
Quem
está em “estado de vigilância” tem a coragem de redefinir-se, de eleger, de
assumir-se; é alguém preparado para dar um salto arrojado e criativo.
É
nessa direção que o “tempo do Advento”, centrado n’Aquele que vem, mobiliza e
re-ordena todas as dimensões da vida e propõe um caminho de humanização. Ele
desafia cada um a assumir o potencial humano criativo que estava latente em seu
interior.
Estar
atentos e vigilantes é uma condição humana e cristã para viver intensamente;
viver distraídos e dispersos é perder as oportunidades de muitos encontros, é
deixar que o outro passe ao nosso lado sem nos darmos conta, é deixar que Deus
passe sem que o percebamos, é deixar passar o momento em que Ele nos chama e
perdemos a oportunidade de dar uma resposta vivificadora.
Viver
é estar atentos à vida, a nós mesmos, aos demais. Viver é estar atentos às
ocasiões únicas, às oportunidades que não voltam; viver é estar com os olhos
abertos para contemplar, é estar com os ouvidos atentos para escutar.
Texto
bíblico: Mt 24,37-44
Na
oração: + Em quê dimensões da vida você sente a força desagregadora da
“dispersão”?
“Vida
atenta” é vida com largos horizontes: neste Advento, o que você está “lendo” no
seu horizonte pessoal, social,
profissional, familiar, religioso...?
Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, SJ