Texto do Pe. Adroaldo Palaoro, sj como sugestão para rezar o Evangelho do 33º. Domingo do Tempo Comum (Ano B).
“Quando os ramos da figueira
ficam tenros e as folhas brotam, sabeis que a primavera está próxima”
A natureza se renova continuamente através dos
brotos; muitas vezes nos fixamos na velha árvore e temos a sensação de que ela está
morta. Mas, de repente, das profundezas das raízes, uma nova seiva vai
emergindo, fazendo aparecer novos brotos que apontam para os frutos vindouros.
O que a vida cristã
precisa claramente, neste momento de desânimo e de abatimento, não é resignação
diante do contexto no qual vivemos, mas de vida
e vitalidade. Precisamos alimentar
a esperança para empreender novos caminhos com entusiasmo renovado e sem temor.
O seguimento de Jesus, mais
que prudência, conformidade ou conservadorismo que pretende preservar as coisas
do passado em lugar de sua sabedoria, requer audácia, precisa de membros adultos que resistam ao envelhecimento
da vida, e jovens que resistam ao envelhecimento da alma.
Muitas vezes, onde deveria
reinar a ousadia, reina a
resignação e a passividade, onde deveria reinar a criatividade, reina a
repetição doentia, onde deveria reinar a “narrativa” da vida de Jesus, reina a
doutrina pesada e o legalismo estéril. A tentação consiste em fazer da
sobrevivência a nossa máxima aspiração, em vez de vivermos a vida plenamente, com toda profundidade
e o entusiasmo que nossa vocação cristã exige.
A capacidade de arriscar situa a vida cristã deste
tempo perante o desafio de confiar ao máximo em Deus. A capacidade de arriscar
é a virtude que fará a ponte entre a vida cristã atual e a que está para vir.
Pertencer a uma antiga
instituição não é desculpa para não ter ideias jovens e não fazer coisas novas.
Ao contrário, é
precisamente a idade da instituição que exige isso. É a virtude de viver
plenamente até a morte que se exige da vida cristã atual, se quisermos que os
brotos voltem a surgir.
É a virtude do risco que precisamos alimentar de novo:
risco nos mais velhos que acreditam que os grandes riscos de sua vida já tinham
passado; e risco nos novos membros que pensam que uma vida fundada no
seguimento de Jesus e no serviço é uma vida sem nenhum risco.
A revitalização do
seguimento de Jesus não consiste em redefinir suas formas, sua doutrina, seus
dogmas, seus ritos... senão em reavivar seu significado, seu direito a continuar tendo sentido diante das novas
inquietudes e das realidades atuais.
O mundo que está
mudando ao nosso redor provoca mudanças em nós também. O importante é que
cheguemos a “ser” o que devemos ser num mundo que nos arrasta com ele.
“Eu não teria gostado de viver sem
haver inquietado alguém alguma vez”
(Catherine de H. Doherty)
A questão é se a vida
cristã provoca e inquieta o suficiente em nosso atual momento. A verdadeira
questão é esta: na velha árvore do cristianismo, ainda surgem brotos para suscitar
a energia necessária a fim de tornar mais autêntico o nosso compromisso com o
Reino?
Estamos num tempo de mudança, mas também emocionante e
santo, para a vida cristã.
Há uma poderosa seiva presente
por debaixo das raízes. O único que
temos a fazer é não impedir o seu deslocamento em direção aos ramos, para que
novos brotos de vida possam aparecer. A impressão que temos é que a vida cristã
parece ter muito mais “galhos secos e sem vida” do que folhagem e frutos novos.
Por isso, de tempos em tempos
precisamos passar por “abalos sísmicos”, tanto no nível interno de nossas vidas
quanto na instituição eclesial, para derrubar o que está seco e caduco e deixar
emergir o broto vital, que alimenta nossa esperança e abre um horizonte de
sentido.
O “sol” do ego inflado
precisa se esvaziar no escurecimento; a “lua” da vaidade precisa deixar de
brilhar para si mesma; as “estrelas” do auto-brilho precisam cair... É do meio
do “cosmos”, interno e institucional, renascido e reordenado, que poderá
emergir o “Filho do Homem”.
Sabemos que o ciclone tem uma violência enorme e gira velozmente, mas
seu centro é calmo, imóvel.
É preciso retornar ao centro do ciclone onde está o “Filho do Homem”,
onde está o coração, onde está o Cordeiro. Esta vida nova está no centro da
situação que vivemos, no centro desse mundo que é o nosso.
É a partir do interior que
algo pode mudar.
O evangelho deste domingo tem profundas ressonâncias apocalípticas, ou
seja, uma revelação, um des-velamento, um des-nudamento dos múltiplos véus que
revestem o palco, lúdico e trágico, da encenação do drama humano, com suas
contradições, incertezas, promessas e esperanças.
Devido às imagens que este gênero literário utiliza, com frequência
atribui-se ao termo “apocalipse” um significado
de “catástrofe” ou “destruição”. A realidade, no entanto, é diferente.
Etimologicamente “apokalypsis” significa “destapar o que está escondido”, “tirar o véu”, “des-velar”, ou seja, “re-velação”.
Assim pois, etimologicamente, “apocalipse” equivale a “verdade” (“aletheia” = sem véu). E,
como consequência, o escrito apocalíptico pretende “retirar o véu” que nos
impede reconhecer as coisas como são, ou seja, revelar-nos o que se encontra
por debaixo da superfície, em um nível mais profundo. É como se o autor do
evangelho quisesse nos dizer: “as coisas não são o que parecem ser”.
Em cada momento histórico o texto do Apocalipse é lido e interpretado em
função dos acontecimentos. Este gênero literário é uma luz que nos ajuda a “ler” a realidade (interior e exterior),
desvelando tudo o que acontece nela e assim poder assumir uma atitude mais
coerente com a proposta do Evangelho.
Nesse sentido, podemos “ler” o texto do evangelho como se escutasse um
sonho revelador.
O Apocalipse, portanto, é um
empenho da comunidade cristã em dar sentido a tudo o que está acontecendo,
reencontrando sua dignidade no coração das situações mais difíceis.
A revelação que ocorre no
interior de cada um e na realidade que nos envolve é o des-velar (tirar o véu)
de uma Presença. No centro de nossa solidão e de nosso exílio não
estamos sozinhos, mas temos a visão de Alguém,
que vem ao nosso encontro.
A partir de um imaginário “catastrofista”, o evangelho aponta à esperança,
exige atenção e responsabilidade com os sinais menores e cotidianos para
indicar que o presente tem futuro, porque Deus não abandona a criação e a
humanidade mais ferida; Ele está enraizado no mais profundo dela como uma
potência surpreendente que pede nossa responsabilidade e ousadia.
Na verdade, os discursos escatológicos e os anúncios
apocalípticos, apesar de sua aparência, são sempre um chamado à esperança.
Esperança que não é uma projeção para um futuro incerto e que serve para fugir
do presente ou para poder “suportá-lo”.
A autêntica esperança, no entanto, não só não nos afasta do presente, senão nos enraíza nele. Porque, realmente, só há uma esperança: aquela que corresponde ao desejo de viver intensamente o “Agora”. Essa é a única coisa que aspiramos: reconhecer-nos e viver na Plenitude do que é, no presente pleno, na presença que somos. Presente que se abre ao novo futuro. E para este “novo tempo” nos dirigimos quando nos permitimos viver no coração do presente, quando nos deixamos encontrar por ele. Presente carregado de uma Presença providente.
Texto bíblico:
Evangelho segundo Marcos 13,24-32
Na oração: Como muitos mestres e mestras, cujas vidas são testemunhas da esperança,
nos perguntamos:
- É possível
“esperançar” quando sinto que a realidade é um “beco sem saída”?
- Como “esperançar”
em meio a tanta violência, destruição, preconceito, indiferença?
- Qual tem sido meu
suporte e ajuda nesses momentos da vida e como posso oferecê-lo aos outros?
- Quê ou quem me
ajudou a despertar a esperança nos momentos mais obscuros?
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